OS CONFLITOS INTERNOS DA PERSONAGEM RAQUEL EM A BOLSA AMARELA DE LYGIA BOJUNGA NUNES

Tipo de documento:Revisão Textual

Área de estudo:Física

Documento 1

A busca de Raquel pode ser denominada de aventura, pois se inicia quando a menina percebe que possui três grandes vontades que não param de aumentar: a vontade de crescer, de escrever e de ser garoto; de modo que essas vontades surgem em momentos variados e tomam conta da menina. Raquel ainda não atingiu a adolescência, mas seus conflitos há muito já vão além do universo estritamente infantil; de acordo com Lígia Cadermatori (1986) o mundo ficcional da narrativa de Lygia se arma a partir da infância, mas atinge temas adultos como as relações de poder e a repressão à liberdade de expressão no contexto social. Em A bolsa amarela temos o foco de uma jornada interior de Raquel projetada na imensa bolsa amarela que a menina carrega e que materializa de formas variadas os seus conflitos de crescimento.

Raquel é uma personagem que se vê impulsionada a criar um universo que a acolha e a estimule para enfrentar a realidade, contudo, é uma menina solitária que se apresenta em conflito consigo mesma e com a sua família, dado ao fato desta reprimir os seus desejos. A personagem principal e as personagens que a circundam A obra A bolsa amarela é divertida e incutida de diversas aprendizagens, é narrada em primeira pessoa com apresentação de ação e diálogos fundamentais, criando dessa maneira, forte identificação com os leitores: Prezado André Ando querendo bater papo. Assim, em A Bolsa Amarela conhecemos toda a narrativa a partir dos pensamentos e reflexões da personagem principal – Raquel – que nos encanta por seus conhecimentos e permite-nos aceitar as outras personagens da história, pois sua capacidade de imaginar é real e simples, fazendo com que idealizemos todas as fases da história juntamente com ela, principalmente aquelas que nos remete à reflexão através de diálogos com seres de seu imaginário, do seu mundo pueril, um mundo espetacular, sem dúvida alguma.

Um dia, a personagem ganha uma bolsa amarela que vem no pacote da tia Brunilda. A partir daí, a bolsa passa a ser o esconderijo ideal para suas invenções e vontades. Tudo cabia lá dentro. A relação da personagem Raquel com a bolsa é evidenciada a partir dos objetos que nela são depositados e das personagens que nela habitam - o galo Afonso, o galo Terrível, ‘a’ Guarda-chuva, o Alfinete de Fralda - convivendo com as três grandes vontades que ela carrega e que por vezes, aumentam de tamanho e pesam demais. Representa os sonhos da personagem, onde ela deposita seus íntimos segredos, longe de que tudo que a perturba, principalmente da família que não acredita nela e não compartilha seus sonhos e fantasias.

De acordo com Cademartori (1984), a bolsa é o maior símbolo da narrativa, apresentando características peculiares almejadas por Raquel: “tem cor viva, e variável, é grande; não está só, pois tem a companhia da alça; não está vazia, porque guarda dentro de si sete bolsinhos”. p. Para lidar com suas vontades, principalmente com a vontade de ser escritora, Raquel inventa André, um amigo imaginário, para quem passa a escrever cartas – aquelas que envia para ele, bem como as respostas que recebe - iniciando-se, assim, as primeiras reflexões acerca de sua condição familiar através do fato de seus irmãos já serem adultos e ela ser a única criança da família, e de ter nascido em uma época em que sua mãe já não tinha condições de ter outro filho.

O real e o imaginário No livro “A Bolsa Amarela”, encontramos objetos lúdicos, um perfeito equilíbrio entre a liberdade do imaginário e as restrições do real. Isso acontece porque a autora oferece elementos para que o leitor se identifique com as condições, sentimentos e ações que encontramos nas personagens: Mas aí o galo cantou muito aflito: um canto assim de gente que tá presa e quer sair. “Tá dentro da bolsa amarela!”. Abri a bolsa correndo. O galo saiu lá de dentro. NUNES, 2002, p. O sofrimento vem do fato da mesma ser relegada a segundo plano e tratada com menos importância justamente por sua condição infantil. Os universos da infância, da fantasia e do imaginário não são considerados pelos adultos, que priorizam os próprios afazeres e as dificuldades de sobrevivência ofuscando assim, as relações de cumplicidade e afeto.

Olhei para minha mãe e ela fez cara de quem diz: “não cria caso, sim Raquel?” Meu irmão tava do meu lado e disse: “come”. Minha irmã tava do outro e me deu uma cutucada pra comer. Vi que ia dar alteração. NUNES, 2002, p. Deste modo, Raquel demonstra admiravelmente a falta de atenção e de carinho que atinge muitas crianças do nosso mundo real através do seu imaginário. O conceito da família contemporânea: a relação com a narrativa “ficcional” Para relacionar a obra de Lygia Bojunga Nunes aqui analisada (com foco nos conflitos da personagem Raquel com a sua família) à realidade, apresentaremos uma síntese do conceito da família contemporânea, demonstrando assim, a importância da obra da autora não só para o mundo estritamente infantil, mas para o universo do conhecimento.

O que se houve hoje em dia, principalmente pelos mais velhos, é a mudança que ocorreu nos princípios fundamentais da família: “A família de hoje já não é mais como a de antigamente”. Isso porque além de não fazer as refeições juntos todos os dias, não se toleram mais, não atravessam um problema de mãos dadas, nem transmitem palavras de incentivo e apoio quando um de seus membros desesperadamente precisa. Muitas vezes, o adulto age de forma repressiva, conforme a família de Raquel agiu ao descobrir que ela se comunicava com amigos imaginários. A família não buscou, seguindo os pensamentos de Held (1980), ajudar no desenvolvimento da menina, ao contrário, tentaram retirar da cabeça da pequena as raízes da sua imaginação criadora: “Escuta aqui: por que é que você acha que eu vou acreditar nessa história? “[.

Guarda essas idéias pra mais tarde, tá bem? E em vez de gastar tanto tempo com tanta bobagem, aproveita pra estudar melhor. Ah! e olha: não quero pegar outra carta do André, viu?”. NUNES, 2002, p. Vemos assim, a atitude do adulto perante a criança, agindo com repressão. No que concerne ao nível de valores, COELHO (1995), nos mostra que a obra denuncia as consequências negativas da educação tradicional, dogmática, inibidora, restritiva ou paralisadora. Esse procedimento que faz parte da formação educacional que Raquel recebe em casa, no seu cotidiano, representa o autoritarismo e a imposição, situações aceitáveis em tempos anteriores, nas famílias patriarcais e que são ainda hoje recorrentes, embora seja a conversa e o relacionamento amigável que devam guiar a educação e a formação pueril.

Acima de tudo, é o afeto que deve determinar a educação e a relação entre os membros da família contemporânea ou moderna, principalmente na relação com as crianças. Os membros da família de Raquel: uma protagonista especial Apesar dos conflitos da narrativa acontecerem em torno de Raquel, ela é a protagonista e demonstra ser a mais forte da história, seus pais e seus irmãos não tem nome, mas seus amigos imaginários sim. Antes de continuar contando o que aconteceu, é bom explicar que o Alberto adora implicar comigo. A gente se vê pouco, mas ele sempre arranja um jeito de me encher a paciência. NUNES, 2002, p. Na casa dos consertos Raquel encontrou a família ideal, assim como ela gostaria que fosse a sua, que a amasse e a aceitasse; onde cada membro respeitava a individualidade e autonomia do outro.

A casa dos consertos é um espaço muito importante na narrativa, pois é lá onde a menina faz suas descobertas: ser criança é bom, ser menina é bom, os adultos não são maus, não existem tarefas específicas para homens e para mulheres, ela encontra o que ela gostaria de ver em sua própria casa: - Não tem sempre uma porção de coisas pra resolver? Quem é que resolve? - Nós quatro. – Ela riu. E eu fiquei achando que gente grande não era uma turma tão difícil de entender que nem eu pensava antes [. NUNES, 2002, p. A superação dos conflitos de Raquel Aos poucos percebemos que Raquel supera os seus medos, angústias e adversidades. O seu faz de conta a ajuda espetacularmente, fazendo com ela um grande trabalho psicológico.

Nunes, 2002, p. Tanta coisa estava sumindo no ar que eu nem sei o que é que eu pensei. Só sei que começou a chover, e quando fui fechar a bolsa amarela vi o Alfinete de Fralda [. E é bom sempre andar comigo: de repente você tem outra vontade que começa a crescer demais e eu, pin! Dou uma espetada nela [. Botei ele de novo no bolso bebê e fui andando pra casa. Sendo a narradora direta ou indiretamente de todas as histórias, ela expõe sempre o que pensa e discute os comportamentos sociais que lhe parecem falsos e absurdos, dando possibilidade ao surgimento de novos conceitos que valorizam a verdade, a fantasia, o lúdico e os caminhos da liberdade, propiciadores do conhecimento de si mesmo e do mundo.

Com uma linguagem simples, metafórica e instigante ela mergulha no universo infanto – juvenil. Assim, Bojunga faz com que suas personagens sejam eternizadas e lembradas em cada momento histórico. De acordo com Cademartori (1984, p. A latência simbólica de A Bolsa Amarela, sem dúvida, não se entrega à decifração infantil. Rio de Janeiro: Guanabara, 1978. BRAIT, Beth. A personagem. São Paulo: Ática, 1985. P.   CRISTÓFANO, Sirlene de Lima Corrêa; CARNEIRO, Maria do Nascimento. O ITINERÀRIO SIMBÓLICO EM A BOLSA AMARELA DE LYGIA BOJUNGA: “Fantasiar para Incluir”. Porto, 2009, 96p. Tese de Mestrado – Departamento de Estudos Portugueses e Estudos Românicos, Faculdade de Letras da Universidade do Porto- FLUP. COELHO, Nelly Novaes. A bolsa Amarela. Rio de Janeiro: Objetiva, 2002.

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