O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA APLICADO AO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO EM FACE DAS GRAVES VIOLAÇÕES AOS DIREITOS HUMANOS

Tipo de documento:TCC

Área de estudo:Direito

Documento 1

Punição. Ressocialização. Dignidade Humana. INTRODUÇÃO O tratamento dado aos detentos foi sendo modificado ao longo dos tempos. As formas arcaicas de impor sanções evoluíram no Brasil. As perdas suportadas pelo apenado transcendem a perda da liberdade: ociosidade, instalações precárias, superlotação, violências sexuais e físicas, assistência médica deficiente, homicídios, motins, são algumas das violências sofridas pelos detentos. Por fim, a preocupação com os encarcerados pode ser explicada tendo em vista que os mesmos um dia ganharão a liberdade e, então, poderão começar uma nova vida com dignidade ou voltar a delinquir, agravando ainda mais os impactos da criminalidade. Portanto, é importante não ignorar a situação de caos em que se encontram os presídios, sendo necessário levantar reflexões a respeito da eficácia das instituições penais para o resgate de pessoas que se desviaram – ou se viram impelidas a desviar pelas circunstâncias – das expectativas da sociedade.

Trata-se de um estudo exploratório que apresenta uma pesquisa bibliográfica com vistas a conhecer as ideias e pensamentos de alguns autores que se dedicam ao estudo do sistema prisional. A pesquisa bibliográfica foi realizada a partir da leitura e interpretação de materiais já publicados em legislações e doutrinas que se debruçam sobre o tema em análise. A estruturação do Estado passa a encontrar expressão, portanto, a partir do momento em que entende necessária a entrega de parcela das liberdades de cada um dos componentes daquela sociedade em troca de segurança, pacificação das relações sociais, regulação das atividades da comunidade e de proteção do bem jurídico. Decorrente da própria constituição do Estado e da vida em sociedade, o direito de punir começou a encontrar justificativa a partir do instante em que foi detectada a reunião das pequenas parcelas de liberdade de cada sujeito que integra determinado grupo social em prol da harmonização da vida coletiva.

Assim o exercício de poder apresenta seu fundamento existencial na tutela coletiva, sendo a punição decorrência do interesse estatal em prol da tutela comunitária, de modo que qualquer expressão punitiva que se distancie da premissa protetiva e não se coadune com o princípio da dignidade da pessoa humana, constitui abuso e não justiça (BECCARIA, 2015). Dessa maneira, a punição se apresenta como decorrência da organização social através do surgimento do ente estatal, figurando como meio apto a sancionar o violador das regras de convivência social pacífica que, segundo as balizas de um Estado oriundo do contrato social, tem por escopo viabilizar a proteção social e, por conseguinte, afastar a insegurança individual e o medo, consistindo tal intento na justificativa de constituição do próprio Estado.

Partindo-se da construção contratualista do Estado, este passa a ser o efetivo protetor dos bens juridicamente relevantes no cenário social, passando-se, assim, a responsabilizar o mesmo pelo exercício do direito e dever de punir quando se detecta a violação da norma. Destarte, a punição deve ser utilizada quando necessária a preservação da pacificação das relações sociais, consistindo a pena em recurso elementar ao qual o Estado apenas deverá se utilizar quando detectada a imprescindibilidade desta para salvaguardar a convivência entre os homens. Sob essa perspectiva depreende-se que a ideia de punição deverá ter por norteio a premissa da necessidade, competindo apenas ao Estado, através do exercício do ius puniendi desta fazer jus, quando necessária a preservação da pacificação social e da tutela do bem jurídico relevante.

O exercício do ius puniendi pelo Estado denota assim limitações, implicando estas no mecanismo apto a definir as diretrizes do exercício punitivo, de modo que o sancionamento apenas deve ser utilizado quando este se mostrar indispensável para assegurar a convivência coletiva de maneira pacífica (ROXIN, 2006). Destarte, a imposição punitiva encontra balizas, devendo ser observado pelo legislador quando impõe a sanção penal não apenas a fixação obrigacional que deve ser cumprida pelo violador da norma, mas, também, a criação de direitos que tendem a resguardar a legalidade do exercício punitivo e a dignidade da pessoa humana. A pena pode ser compreendida como o impulsionamento estatal que tende a devolver com o mal punitivo ao mal delitivo, de modo a carregar como característica a ideia de retribuição, a punição consubstancia-se em atividade ínsita ao ser humano e a vivência em sociedade (MAGGIORE, 1972).

Contudo detecta-se que, em pleno século XXI, ainda não se consegue visualizar com clareza a efetiva superação das mazelas sancionatórias do passado, marcadas, sobretudo, pelo castigo corporal (OLIVEIRA, 2007). Dessa maneira detecta-se que a execução da pena ainda carrega em si as vicissitudes anteriores, apesar da vultosa mudança do ideário punitivo. O Estado, a segurança pública e a privação da liberdade O Estado é criação humana para arregimentar, fomentar e resguardar os contornos de uma sociedade. A figura do Estado será, portanto, a detentora do Poder Social, com o propósito de tolher os instintos humanos de ingratidão, inconstância, hipocrisia e ganância, com o propósito de promover a paz social, como desenhou Maquiavel (2011), no Século XVI. Os Estados Modernos, subscritores da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 e defensores da Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, no que concerne à sanção, preconizam o cerceamento de liberdade como algo justo e equânime a todos aqueles transgressores da lei de seus ordenamentos jurídicos.

A perita continua listando as violações encontradas na vistoria: [. pessoas privadas do devido processo legal, sem direito à defesa, e vítimas de tortura no momento de detenção, agressores na abordagem e na delegacia, boletins de ocorrência assinados sem depoimentos, violência física e psicológica dentro das unidades, superlotação, péssima qualidade de serviços básicos como assistência médica e alimentação, condições degradantes de salubridade, higiene e ventilação, entrada de forças especiais para revista de celas com violência e destruição de pertences pessoais, durante a qual os presos são obrigados a passar horas nus ou apenas de cuecas sentados no pátio sob o sol, revistas vexatórias de familiares e presos, falta de itens de higiene, comercialização de produtos básicos em cantinas de presídios, abusos em casos de maternidade e a ausência de investigações e responsabilização de inúmeras ilegalidades (Azenha, 2017, p.

A descrição deixa claro que o sistema prisional do Brasil está em colapso. Colapso esse que se prolonga por anos sem melhorias significativas e com picos de crise que com grande frequência dão origem às manchetes veiculadas pela mídia. A título de exemplificação, em São Paulo, na década de 90, uma grande quantidade de rebeliões, fugas, resgates e execução de detentos, marcaram as prisões (DIAS, 2016). São 306 detentos para cada 100 mil habitantes. Procedendo-se à comparação com a média mundial, que é de 144 presos, esse número, aliado aos demais dados aqui expostos, demonstra que existe uma grande disposição em encarcerar por parte do Estado brasileiro. E quem são essas pessoas aprisionadas no Brasil? A observação da população carcerária demonstra que 64% são negros ou pardos, 74% são do gênero masculino, somente 9% conseguiu concluir o ensino médio, 52% cometeram crimes contra o patrimônio (roubo) ou tráfico de drogas, e nos presídios femininos essa taxa é ainda maior, 73% (BRASIL, 2017), o que deixa claro que a população carcerária brasileira, em sua maioria, pertence a um recorte populacional de classe e raça que, mesmo antes de transigir normas legais e entrar no sistema, já sofria com a marginalização.

Além disso, o Brasil conta com um elevado índice de presos provisórios que sobrecarrega o sistema prisional em 40% do total de aprisionados no país, cuja motivação para o encarceramento se encontra em indícios subjetivos de culpa, e não na condenação definitiva pela justiça, dando ao investigado todos os meios para que exerça o contraditório e a ampla defesa (Straube, 2016). Esse fato é ainda mais preocupante, pois, provavelmente é grande o número de inocentes encarcerados. A prisão de segurança máxima de Norgerhaven, cidade de Veenhuizen no norte da Holanda, é reflexo deste cenário. Aulas de culinária, por exemplo, fazem parte das iniciativas de reabilitação dos detentos, o que implica que alguns daqueles condenados podem, inclusive, portar facas de cozinha dentro do estabelecimento prisional, mesmo que cumpram sentenças por crimes violentos.

Segundo o Diretor da Prisão Jan Roelof van der Spoel, a política criminal do país visa ao indivíduo, em vez de um fim social genérico e, muitas vezes, inatingível. Tratamentos de gestão da raiva, vício em drogas ou problemas financeiros podem levar à prática de ilícitos e, segundo Spoel (2017), buscam ser resolvidos dentro do sistema penitenciário. Educação, estruturas sociais, políticas públicas e, até mesmo, a cultura e os costumes estão todos diretamente ligados à lógica de um povo. O contrato se concretizou em 2009 pela Secretaria da Defesa Social de Minas Gerais e pela empresa Gestores Prisionais Associados (doravante GPA), que é um consórcio de empresas de propósito específico. Consistindo em uma espécie de sociedade, tal como o próprio nome sugere, prevê a solidariedade societária entre os integrantes e possui personalidade jurídica.

Além disso, executa atividade econômica específica e delimitada. Dessa forma, a GPA é uma sociedade de propósito específico, constituída por cinco empresas de direito privado, que se comprometeram por um período de 27 anos a construir, manter e gerir o Complexo Penal de Ribeirão das Neves. Porém, o Estado continua implicado na execução do contrato, embora não participe diretamente da maioria das questões gerenciais, tem como missão principal monitorar o serviço prestado pelos entes privados (SANTOS, 2017). Os pavilhões são denominados “vivências”, e cada um possui 24 celas, sendo 22 (vinte e duas) normais e 2 (duas) adaptadas para deficientes físicos cadeirantes. Cada pavilhão pode abrigar até 90 (noventa) presos, o que perfaz um máximo de 720 (setecentos e vinte) presos por unidade (Bergamaschi, 2017).

O presídio conta com área administrativa, rouparia, sala de monitoramento de segurança, escritório para assistência jurídica, celas exclusivas para os presos se comunicarem com seus advogados, instalações médicas e odontológicas, farmácia, sala de assistência social, salas de aula (Figura 2), espaços para oficinas de trabalho (Figura 3), áreas de lazer e quartos para visitas íntimas (Bergamaschi, 2017). Figura 2 – Sala de aula no Complexo Prisional de Ribeirão das Neves Fonte: Santos (2017) Figura 3 – Oficina de costura no Complexo Prisional de Ribeirão das Neves Fonte: Augusto Velloso (2018) No Complexo Prisional, 2000 (dois mil) presos são beneficiados com atividades educacionais. As aulas ministradas englobam o ensino fundamental, ensino técnico e ensino a nível universitário. Para as suítes destinadas à visita íntima, a roupa de cama e o kit de higiene é diferente.

O material de higiene entregue ao preso é de boa qualidade, e diferentemente dos demais presídios, no Complexo Prisional de Ribeirão das Neves, os detentos recebem lâmina de barbear descartável (AZEVEDO; LOURENÇO, 2016). Os consultórios médicos, odontológico e a farmácia ficam do lado oposto reservado às oficinas de trabalho. Nesses espaços, existem celas de espera e celas para pacientes que precisam ficar em observação. Os serviços de saúde oferecem atendimento em nível de atenção básica e conta com três núcleos. As novas mudanças anunciadas recentemente no Brasil A mudança do Presidente da República, que fez uma campanha dando bastante ênfase na segurança pública, veio acompanhada de grande esperança de mudanças.

Uma de suas promessas de campanha era a permissão da posse de armas, mas ainda não pode ser cumprida. Decerto esta é uma medida apenas para responder aos anseios da população e cumprir com a principal promessa de campanha de Jair Bolsonaro, mas não irá resolver o problema da segurança pública. As medidas mais aguardadas, no entanto, eram as anunciadas pelo então Ministro da Justiça, Sérgio Moro. O ano de 2019 começou com uma sucessão de ataques promovida pelo crime organizado no estado do Ceará, incendiando dezenas de ônibus, carros de passeio e um caminhão de lixo, além de disparar tiros contra uma agência bancária e instalar uma bomba abaixo de um viaduto. No Brasil, na região metropolitana de Belo Horizonte, foi firmada uma parceria público-privada no Complexo Prisional de Ribeirão das Neves, que parece estar proporcionando dignidade e melhores oportunidades de ressocialização aos detentos.

O resultado tem sido um presídio sem motins, rebeliões ou eventos de violência. Ademais, ao participarem de oficinas e terem acesso ao trabalho e educação, os presos conseguem vislumbrar uma vida pós-prisão, com maiores oportunidades e esperança. Já a Holanda conseguiu reduzir o índice de criminalidade investindo em educação, práticas restaurativas e empoderamento dos detentos. Com base nessas experiências, é possível afirmar que a punição não deve enveredar pelo estabelecimento de sanções injustas, de modo que o funcionamento de qualquer sistema penal deve ser considerado em sua totalidade para afastar pretensões que, lastreadas pelo crivo de justiça, implique em punições obscuras. É acreditando na possibilidade de mudança de mentalidade da sociedade, transformações culturais na ideia que se tem sobre segurança pública, que se persevera na importância do debate, para que seja consolidado um sistema eficaz no combate à criminalidade e ao mesmo tempo compatível ao Estado de Direito.

REFERÊNCIAS ANJOS, F. V. dos. Execução Penal e Ressocialização. Disponível em: http://www. augustovelloso. com. br/projeto_interna. php?Id projetos=7&idioma=en. º Encontro Anual da ANPOCS, 24 a 28 de outubro de 2016, Caxambu – Minas Gerais. BATISTA, Nilo. Matrizes ibéricas do sistema penal brasileiro. Rio de Janeiro: Instituto Carioca de Criminologia: Freitas Bastos, 2000. BECCARIA, Cesare. Acesso em: 15 mai. Bergamaschi, M. Com três anos, presídio privado em Minas Gerais não teve rebeliões. O Globo, 07/01/2017. Disponível em: https://oglobo. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. BOZTAS, D. S. Netherlands doesn’t have enough criminals to fill its prisons as crime to drop. Brasília, DF, 2017. Disponível em: http://depen. gov. br/ DEPEN/noticias-1/noticias/infopen-levantamento-nacional-de-informacoes-penitenciarias-2016/relatorio_2016_22111. pdf. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000. Conselho Nacional de Justiça. Reunião Especial.

Brasília, DF, 2017. Disponível em: http://www. Elpaís. No aniversário da crise dos presídios, nove mortos em rebelião em Goiás. Penitenciárias, 02/01/2018. Disponível em: https://brasil. elpais. Bolsonaro cumpre uma promessa: facilita a posse de arma. Mas o mais esperado é o pacote que virá de Sérgio Moro. Revista Exame, Seção Especial Governo Bolsonaro, edição 1177, ano 53, n. jan. MAGGIORE, Giuseppe. ed. Rio de Janeiro: Grupo Editora Nacional, 2017. OLIVEIRA, Eugênio Paccelli. Curso de Processo Penal. ed. Direito Penal: Parte Geral. ed. Florianópolis: Conceito Editorial, 2010. SANTOS, M. R. Lei de Execução Penal Comentada. Curitiba: Juruá Editora, 2018. SPOEL, V. D. Holanda enfrenta “crise penitenciária”: sobram celas, faltam condenados. VITTO, R. C. P de. Justiça criminal, justiça restaurativa e direitos humanos. In: VITTO, R.

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