O REGIME DISCIPLINAR DIFERENCIADO E AS POSSÍVEIS VIOLAÇÕES CONSTITUCIONAIS EM SUA APLICAÇÃO

Tipo de documento:Artigo acadêmico

Área de estudo:Direito

Documento 1

Palavras-chave: Direito Penal do Inimigo. Regime Disciplinar Diferenciado. Violações constitucionais ABSTRACT The present study aims to discuss the possible constitutional violations in the application of the differentiated disciplinary regime (RDD). To this end, it presents a historical approach that demonstrates the need of man to live in society, his absolutist tendency and the creation of jus puniendi; briefly contemplates the Enemy's Criminal Law approach against the elements of custodial sentences; and addresses the constitutionality of the RDD institute. As a methodology, a bibliographic research was carried out in materials already published, such as laws and doctrines that study the subject under analysis, allowing to conclude that the criminal legal orientation currently faces unusual situations of space and time, requiring a re-reading of the traditional institutes of repression. O DIREITO DE PUNIR A sanção se apresenta assim como uma decorrência inerente da própria vivência em coletividade, que efetiva a existência da punição como condição necessária à convivência social harmônica, à pacificação das relações em comunidade e à própria tutela do bem jurídico.

Desse modo, segundo Beccaria (2013), a necessidade faz com que o homem passe a renunciar parcela da sua liberdade individual em prol a harmonização da vida em coletividade. Nesse sentido advém a concepção de que cada pessoa apenas concorda em renunciar parcela de sua liberdade em prol do que se mostra necessário, que implica na prevalência da pacificação social da vivência coletiva. Assim, o processo civilizatório se constrói quando se detecta a expressão da insatisfação social que antecede a tutela dos bens jurídicos pelo Estado, de modo que, cansados de viver na incerteza do gozo dos bens (vida, liberdade e patrimônio, dentre outros), exsurge o Estado como ente garantidor dos bens jurídicos (BEIRAS, 2016). A renúncia a liberdades individuais em favor da segurança e da vida em coletividade passa assim a trazer ao lume as diretrizes de uma sociedade contratualista, onde o ente estatal vem a restar constituído em face da renúncia parcial das liberdades particulares de cada sujeito em seu favor, para assim poder fazer preponderar a manifestação de uma vontade geral social.

Tal perspectiva advém do fato de que o fundamento punitivo encontra seu embasamento exatamente em face das próprias liberdades individuais e, por conseguinte, não pode desconsiderar a existência destas ao sancionar. O surgimento do poder estatal originou-se exatamente em face da necessidade do exercício de controle das atividades sociais, passando a estatuir as condutas que seriam admitidas e vedadas em prol da conservação das liberdades individuais, pugnando assim pela evitabilidade da lesão a bens jurídicos mais relevantes e fazendo com que a punição passasse a encontrar aplicação quando manifestas as violações as regras sociais (BECCARIA, 2013). A punição se apresenta como um desdobramento do poder do Estado em seu viés sancionatório que, para preservar as relações coletivas dotadas de harmonia, passa a organizar a aplicação punitiva apta a preservar a inviolabilidade e a efetiva proteção do bem jurídico relevante.

A percepção da pena em uma sociedade pluralista e democrática se expressa quando o poder punitivo estatal se mostra capaz de resolver o conflito criminal de forma racional, institucionalizada e formalizada, com o máximo de eficácia, ingressando como meio apto à solucionar os problemas advindos da infração penal quando fracassam os mecanismos primários de autoproteção da ordem social, mas desde que respeitadas as garantias individuais fundamentais consagradas constitucionalmente (SANTOS, 2010). Para Ordeig (1981), a ideia de punição segundo as diretrizes exaradas em um Estado Democrático deve ser apta à satisfazer os anseios de pacificação social, de modo a afastar a violação do bem jurídico e, em contrapartida, garantir a retribuição do mal causado pelo agente delitivo infrator da norma. XLVI. A individualização da pena visa atingir a verdadeira função social da pena, ou seja, a reintegração do indivíduo ao seio social, não objetivando apenas o caráter punitivo e de retribuição do mal causado pelo agente.

Compete à Comissão Técnica de Classificação a triagem e a separação de cada preso. Esta comissão é presidida pelo diretor do estabelecimento carcerário e composta por dois chefes de serviço, psiquiatra, psicólogo e assistente social, quando se tratar de pena privativa de liberdade. Nos demais casos, serão compostas por fiscais do Serviço Social. Deve ser obedecido o contraditório e a ampla defesa e cabe ao Juiz da Execução homologar a sua conclusão apenas quando constituir falta de natureza grave, cuja ocorrência, além das sanções administrativas expressamente previstas na LEP (art. da LEP), acarreta ao preso, severas consequências processuais, como a regressão de regime prisional, perda de parcela dos dias remidos, reinício dos lapsos para fins de benefícios e vedação à concessão de indulto e de comutação de pena por determinado prazo, dentre outras.

As faltas graves somente se aperfeiçoam com a conduta dolosa. Não há falta grave sem dolo, da mesma forma que apenas o crime doloso pode ser considerado falta grave, nos termos do art. caput, da LEP. e 51 da LEP, também constitui falta grave, o cometimento de fato definido em lei como crime doloso, que será passível das mesmas sanções cominadas para as demais faltas graves. No caso de o crime doloso ocasionar subversão da ordem ou da disciplina da unidade prisional, o condenado ou o preso provisório ficarão sujeitos, sem que reste prejudicada a sanção penal cabível, à inclusão no RDD (SILVA, 2018). A norma se refere apenas aos crimes dolosos, excluindo-se os culposos. Não estão excluídos os crimes preterdolosos em que há dolo no crime antecedente e culpa no crime consequente, cuidando-se de espécie de crime doloso agravado por um resultado culposo (SILVA, 2018).

Esta modalidade de falta grave, além de levar à inclusão do apenado no RDD, traz outras consequências para a execução penal, a exemplo da regressão de regime, interrupção do prazo para que a progressão de regime ocorra (para quem se encontra no regime fechado), perda de parcela dos dias remidos etc. A base de orientação, portanto, do Direito penal do inimigo e da terceira velocidade não está no princípio do Direito Penal do fato, mas no de “autor”. Não visa à conduta realizada, mas à periculosidade: o fato futuro. Trata-se, segundo Brunoni (2007, p. “da estruturação do Direito Penal a partir da pessoa do delinqüente e não do fato danoso cometido; de uma nova e reforçada legitimação, em definitivo, do Direito Penal do autor”.

Inconcebível, portanto, com o Princípio de Culpabilidade. Por isso, muitos asseguram que o RDD é simplesmente um castigo físico e moral que é imposto ao preso. Na visão do art. V, da LEP, o RDD seria uma punição disciplinar, o que é invariavelmente incorreto, porque a sanção disciplinar é imposta na esfera exclusivamente administrativa. Como o RDD é fixado por autoridade judiciária, resta claro que o RDD não é uma sanção administrativa e nem pode ser judicial, pois é exigência da jurisdição que o magistrado só puna o culpado no devido processo legal de natureza penal, assegurando-lhe a ampla defesa e o contraditório. Fora do processo penal, não é possível ao magistrado punir alguém, e não há dúvidas que o RDD é uma punição extremamente contrária à integridade física e moral do preso, seja ele condenado ou provisório.

Como se nota, além das causas taxativamente previstas no art. da LEP, já analisadas, a prática de fato definido como crime doloso também é considerada falta grave, com a nova redação dada ao art. da LEP, pela Lei Federal 10. de 2003. É perfeitamente possível, entretanto, que numa mesma conduta comissiva ou omissiva, o preso provisório ou já condenado pratique um fato aparentemente delituoso e uma indisciplina prisional. o TJSP assim decidiu: Independentemente de se tratar de uma política criminológica voltada apenas para o castigo, e que abandona os conceitos de ressocialização ou correção do detento para adotar medidas estigmatizantes e inocuizadora próprias do Direito Penal do Inimigo, o referido regime disciplinar diferenciado ofende inúmeros preceitos constitucionais. Trata-se de uma determinação desumana e degradante (art.

º, III, da CF), cruel (art. º, XLVII da CF), o que faz ofender a dignidade humana (art. º, III, CF). º, XXXIX c/c arts. º e 42 do CP), decorrente da garantia da tipicidade e legalidade (CF, art. º, XXXIX), o mesmo fato não pode ser duplamente apenado. Assim, por exemplo, se o fato é elemento constitutivo do tipo legal, não poderá funcionar como agravante do mesmo crime; no crime de exercício ilegal da medicina, arte dentária ou farmacêutica, não se pode majorar a pena pela incidência da agravante do art. II, “g”, do CP (violação de dever inerente à profissão) (VIDAL, 2011). Além disso, impede a concessão do sursis (CP, art. I); aumenta o prazo de cumprimento da pena, para obtenção do livramento condicional (CP, art.

II); aumenta o prazo da pretensão executória (CP, art. caput); interrompe a prescrição (CP, art. VI); impede, por fim, a aplicação de causas de diminuição de pena, v. ocorrendo, assim, na reincidência, duplicidade de sanções pelo mesmo fato, com violação do princípio da legalidade das penas e da coisa julgada. Ora, ao punir mais gravemente um delito, tomando-se por fundamento um delito precedentemente já julgado, “está-se, em verdade, valorando e punindo, uma segunda vez, a infração anteriormente praticada em relação à qual já foi o agente condenado e punido” (QUEIROZ, 2001, p. constituindo-se a reincidência, como se encontra estruturada no Código Penal, em norma inconstitucional “por violação dos princípios de estrita legalidade e proporcionalidade” (QUEIROZ, 2001, p. Não há como livrar a reincidência do sério inconveniente de constituir-se em violação do princípio de não repetição.

Na agravação da pena do segundo delito, pela reincidência, encontra-se uma dupla repressão pelo fato anterior já definitivamente julgado e em face do qual somente restava a execução in concreto do poder punitivo. de 11. – Lei de Execução Penal (LEP) e o Decreto-Lei 3. de 03. – Código de Processo Penal (CPP). O principal objetivo foi a inclusão na LEP do tão conhecido “regime disciplinar diferenciado” – RDD (FACCIOLLI, 2018, p. Assim, o princípio da legalidade e demais garantias penais e processuais, no sistema em vigor, são mecanismos de instrumentalização da defesa apenas para os indivíduos com maior capacidade financeira em detrimento da grande massa de encarcerados no sistema penitenciário. Há quem entenda que quando não há esperança de que o autor apresente comportamento conforme o direito, falta segurança cognitiva e, então, deve entrar em cena o Direito Penal do Inimigo.

Foi visto que o Direito Penal do Inimigo, construção desenvolvida por Günther Jakobs, sugere que as pessoas são destinatárias da expectativa normativa de um comportamento conforme o Direito; essa expectativa deixa de existir quando não há apoio cognitivo oferecido por seu destinatário; a falta de apoio cognitivo revela que a pessoa destinatária da expectativa normativa é na verdade uma fonte de perigo; a consequência, muito grave, é a recusa de tratamento como pessoa em Direito, o que leva à despersonalização dos autores das práticas criminosas. Ademais, entende-se que o RDD é um instituto de gravidade extrema que provoca abalo psicológico ao condenado. Trata-se de séria repressão que pode trazer prejuízos não só à integridade física e psíquica do condenado, violando o princípio da dignidade da pessoa humana e do non bis in Idem, em razão da dupla punição sofrida pelo apenado, ou seja: é punido com penas maiores por ser membro de organização criminosa e, ainda, tem sua punição agravada com o RDD.

BEIRAS, Iñaki Rivera. Pena Criminal. Tradutora: Denise Hammerschmidt. ed. Curitiba: Juruá Editora, 2016. htm>. Acesso em: Acesso em: 30 out. BRASIL. Lei nº 8. de 25 de julho de 1990. Curitiba: Juruá Editora, 2007. CARVALHO, Salo; FREIRE, Christiane Russomano. O regime disciplinar diferenciado: Notas críticas à reforma do sistema punitivo brasileiro. In: CARVALHO, Salo de (Org. Críticas à execução penal. São Paulo: Atlas, 2018. MORAES, Alexandre Rocha Almeida de. Direito Penal Racional. Curitiba: Juruá Editora, 2016. NORONHA, Magalhães. Curitiba: Juruá Editora, 2018. ORDEIG, Gimbernat. Tieneun futuro la dogmática jurídico penal? In: Estudios de Derecho Penal. ed. Madrid, Civitas, 1981. La expansión del derecho penal. ed. Madrid: Civitas, 2001. SANTOS, Juarez Cirino dos. Direito Penal: Parte Geral. Curitiba: Juruá Editora, 2019. VIANA, Agnaldo. Direito Penal. ed. Curitiba: Juruá Editora, 2013.

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