Uma Liberdade Chamada Solidão

Tipo de documento:Redação

Área de estudo:Religião

Documento 1

A CONSTRUÇÃO DO RAP INDEPENDENTE. UM SÓ CAMINHO E A RUA E NOIZ: ideologias de poder e consumo. A CONSTRUÇÃO DE UM MERCADO ALTERNATIVO. O USO DA MÍDIA E A QUESTÃO DAS RODAS DE RIMA. FILIPE RET, PÓS-MODERNIDADE E O RAP INDEPENDENTE. wordpress. com por interferir diretamente nas teses que apresento. Pensar o rap é pensar a sociedade, as mentalidades. É pensar o momento em que vivemos, a arte e as inquietações de um determinado grupo que ganha voz, de uma maioria apagada que faz dessa voz um instrumento de luta que entoa sentimentos, saberes, conhecimentos, canções, relações de força e ideologias. Pensar o rap é discutir comportamentos, vivências e valores. ” Walter Benjamin – A Obra de Arte na Época de suas Técnicas de Reprodução (1936) No contexto cultural brasileiro, num primeiro momento o rap encontrou lugar significativo principalmente entre a juventude.

Num segundo momento ganhou novos segmentos e trouxe em suas práticas o reconhecimento de uma nova linguagem transformando-se com o tempo em forma econômica e política. No Brasil podemos entender as suas diferentes inserções, assim como propostas políticas principalmente a partir da década de 80. A década de noventa, por sua vez, trouxe diversas formas musicais à tona. Bandas como Nirvana, Rage Against the Machine, Faith no More, Alice in Chains, Primus, Soundgarden, Pearl Jam, Green Day, Blink 192 (novo punk pop), Planet Hemp, O Rappa, Mamonas Assassinas, Titãs, Charlie Brown, Raimundos, Sepultura, Marilin Maison, System of a Down, Slipknot, Tupac, Notorius Big, Body Count, Brujeria e diversos outros ganharam visibilidade não só como banda, mas muitos também como marcas que comporiam um mercado maior.

” (MANUEL VALENZUELA ARCE, José. Vida de Barro Duro: Cultura Popular e Grafite. Rio de Janeiro, UFRJ, 1999. Pág. A indústria cultural, e aí inserimos os canais midiáticos e a estrutura corporativa, preferiu esperar antes de se aproximar do estilo que nascia. ” (MANUEL VALENZUELA ARCE, José. Vida de Barro Duro: Cultura Popular e Grafite. Rio de Janeiro, UFRJ, 1999. Pág. Já John Holloway afirma que, “em 1998, os bens das 200 pessoas mais ricas do mundo somavam mais do que a renda total de 41% da população mundial (constituída por 2 bilhões e 500 milhões de pessoas) A distância entre ricos e pobres aumenta, não apenas entre países, mas dentro dos países”. Dentro desse quadro de contradições uma parcela da juventude se esforça por denunciar, através de suas criações artísticas, uma série de questões que reforçam, inclusive, a própria juventude pauperizada como inimiga do progresso moderno e da ordem social.

Para Valenzuela: “As perspectivas dominantes estabeleceram que nas zonas e bairros populares havia delinquentes, desocupados ou trabalhadores, mas não movimentos juvenis. Isso nos mostra outra das dimensões da análise das representações dominantes sobre a juventude: a sua condição seletiva. A juventude é uma construção que seleciona atores e características, mas também esquecimentos, por isso não é uma definição ingênua ou asséptica, mas destaca e proscreve, pondera e minimiza condições que se referem a processos de hipostatização nas 6 representações sociais. ” (MANUEL VALENZUELA ARCE, José. Não seguem uma determinação única, causal, inteiramente mecânica, apesar dos resultados de arte que se encontram como linguagens em disputa na conjuntura atual apontem muitas vezes para resultados que nega em suas relações o que se pretende estabelecer como arte engajada.

A presente análise visa discutir não só a formação histórica do rap no Rio de Janeiro e São Paulo, mas traçar uma análise crítica sobre a formação do seu discurso, assim como a formação dos mercados, relações e trocas simbólicas. A mercantilização da arte nos serve como ponto central de debate, pois ao que se pretende, a arte deve livrar-se de vínculos históricos que a subjugam como categoria de mercado propondo e pensando alternativas possíveis. A sociedade capitalista trouxe transformações que exigem ser observadas de perto. São formas em disputa que precisam de um árduo trabalho até se chegar a questões que nos ponham de frente com a crítica transformadora, não restando oferta às relações de servidão que a sociedade moderna impõe por trás de imagens espetaculosas e sedutoras.

Visto isso, temos as mais variadas formas de comportamento dos sujeitos que integram a cultura hip hop. O rap, então, como um dos componentes do hip hop, assume seus estilos, pegadas, métricas, rimas, texturas e flows. À perspectiva de um olhar que analisa de cima não conseguiríamos distinguir o rap enquanto campo de disputa tão intenso quanto possível. Os quatro elementos por sua vez ganham suas próprias autonomias enquanto mercado, discurso e expressão artística. É então a uma das formas do que se entende por rap que direcionamos a atenção: o rap independente. As fontes tive acesso para embasar o presente debate faz parte, sobretudo, de uma pesquisa de campo, mas ganha consistência principalmente a partir de uma vivência e uma investigação contínua daquilo que aqui analisamos, alimentando, portanto, o que se entende por campo.

Para tal, coube-nos também participar ativamente da produção de significados do que hoje se configura como movimento underground, assim como a própria linguagem em disputa. Por isso, o referencial mistura-se de forma a produzir tanto uma reflexão crítica sobre o assunto como também uma inserção ativa do que aqui se pretende analisar criticamente. As estruturas de poder que se refletem na linguagem partem de contradições sociais que historicamente ainda não foram superadas. Pensar a mercantilização do hip hop só é possível a partir da análise prévia das estruturas de poder capitalista. Essa força de homogeneização é a artilharia pesada que fez cair todas as muralhas da China”. Tese 165 Guy Debord A modernidade celebra um novo paradigma na história ocidental surgindo através do processo de expansão das sociedades impulsionado pela crescente mercantilização da vida.

O caminho da modernidade e a crescente industrialização, a expansão dos mercados, a mudança nos rumos da economia e a proletarização acompanhado de uma crescente consciência de classe ensejam conflitos que serão o motor da história. O homem marginal era aquele que possivelmente estava “fora do sistema”; um homem não-moderno, não impregnado pelos valores da modernidade. Mas é este também importante ator que fomentou a própria construção do ser moderno através de suas lutas populares. Houve a substituição de uma visão qualitativa por uma visão quantitativa da natureza. Este ser moderno estabeleceu uma nova relação com a natureza e com deus. Não negou deus em sua pura essência, mas o realocou, dessa vez numa posição de não mais subordinar o gênero humano aos caprichos de uma divindade vingativa e controladora.

Deus agora, como acredita Spinosa, é aquele que compõe e forma a natureza proporcionando os encontros. A natureza, por sua vez, encontra-se numa posição de domínio pelo gênero humano, sobre o qual nascem novas categorias de conhecimento que buscam ampliar o entendimento sobre as coisas. Pág. A proletarização da camada substancial da sociedade moderna criou condições específicas para a ação revolucionária do proletário. Condições estas que seguiram com o projeto de mundialização do capitalismo enquanto sistema econômico de produção pautado pela ordem burguesa. Ao criar as condições para impulsionar a mercadoria como fator lógico da existência de mercado, a burguesia também cria condições de organização do operariado. Para Florestan Fernandes, “A condição crítica da classe operária não é independente da sua perspectiva crítica.

” O conhecimento do indivíduo, por sua vez, assim como a manutenção do seu estado como tal, é alcançado dentro da ordem racional. Outro fator importante é a criação dos estados-nação. O estado desenvolve-se dentro da lógica burguesa, centrado, transparente e racional, capaz de ação concertada e transformadora (ainda que amiúde 13 direcionada para a conservação do status quo). A construção do indivíduo pleno, para Marx, só é possível através da implantação do sistema socialista sendo este o resultado final da superação do espírito capitalista de gerir o mundo e suas riquezas. Há também aí nesse novo modo não-capitalista de gestão do mundo, a construção de um novo indivíduo. Entender o mundo moderno é entender a que serve toda a estrutura organizacional tanto no campo físico como no campo das ideias.

A luta de classes, portanto, é o motor. Constrói a partir do que lhe é determinado sob este axioma, relações de tensões que funcionam como contra-corrente da hegemonia a favor da padronização dos corpos. Determinar a forma como as pessoas e as coisas circulam, assim como o seu valor é de fundamental importância para o funcionamento da máquina. É dessa forma que pessoas e mercadorias se equiparam dentro da perspectiva da livre circulação. Ao mesmo tempo, pois, mercantiliza a força de trabalho, a energia humana que produz valor. Por isso mesmo, transforma as próprias pessoas em mercadorias, tornando-as adjetivas de sua força de trabalho. ” (FERNANDES, Florestan, Marx. Rio de Janeiro. Pág. Rio de Janeiro. Pág. Marx não concebe a materialidade fora do processo cumulativo de produção, sendo este resultante de descrições essenciais à própria manutenção do processo revolucionário histórico.

Tem-se assim, a compreensão de tal processo revolucionário dentro dos meandros da ditadura do proletariado. Divergimos nesse ponto ao entendermos que parte da análise marxista sustenta também a permanência do estado atual de coisas. Pág. Não acreditamos que os regimes de democracia representativa sirvam para outra coisa além de um rodízio de exploradores movido pelo consentimento dos explorados. Não é através da eleição de parlamentares ou de gestores públicos que se conseguirá qualquer mudança social para além do capitalismo. É dentro desse processo que entendemos o que vem a ser moderno, modernidade, apesar de, segundo alguns autores, haver claras diferenças entre modernismo e modernidade. Modernismo, segundo Marshal Berman, abarca um caráter principalmente cultural de manifestações que se esforçaram por de alguma forma dialogar criticamente com os avanços de tal paradigma.

As pistas de skate e praças reunia parte da juventude proporcionando trocas culturais. Naquela época, a pista virou um ponto de troca de conhecimentos musicais. As pessoas chegavam com novidades de bandas de fora com fitas k-7 e ali passavam adiante as novidades do momento. Foi nessa época que começou o SpeedFreaks com DJ Rodrigues, Speed Gonzales e BulletProof. Speed, no documentário Mr. A gente não chegava a ensaiar em estúdio. Nossa vida era uma festa todo dia. Uma festa que eu digo, sempre a gente saia e isso impregnava a música assim. A música tinha um humor assim, que refletia com espontaneidade o nosso jeito de viver a vida. ” (Mr. no estágio de produção desse disco que foi o disco que sucedeu essa demo.

Que até então era uma demo esse disco que tava na nossa mão. Então eles entraram em estúdio com Carlinho Bartolini que tinha um bom know how em conseguir extrair timbres fortes e criar umas texturas diferenciadas e eu achava. nós achávamos, e eles também, que o som deles requereria isso, né? Fugir dos padrões do hip hop comum ou cair nas mãos dos produtores do hip hop comum na oportunidade. Era uma coisa que tava meio engatinhando ainda. Era preciso, portanto, de algo mais refinado para que a dupla passasse para um outro estágio. Para tal, não poderiam deixar a produção desse novo trabalho nas mãos de quem não entendia ainda do assunto ou que pertencia a um lugar comum.

Era preciso fugir de certos padrões a que o rap se identificara durante tanto tempo. Uma das questões centrais era falar de outros assuntos, ser mais livre enquanto temática poética. A ideia de que o Rio de Janeiro é superior vem, portanto, sendo construída desde essa época. Num dado momento questionar poderia também não ser teor obrigatório. Com o tempo se construirá uma espécie de campanha entre alguns rappers contra as reclamações. “Nós temos que parar de falar de favelas. Ninguém nasceu pra morar na favela. Deus não meteu ninguém no mundo pra sofrer. aquela frase da Clarice Linspector, né, “perder-se também é caminho”. Isso cansa, sabe qual é. Quem já não tá acostumado a ouvir, começa a ouvir e vê que tudo tem um tom moralista, tudo tem um tom imperialista do tipo faça, veja, faça isso, entendeu, pare de não sei o que.

Quem é você pra me dizer o que eu tenho que fazer? Falar de outros assuntos também é algo recorrente hoje e mesmo Black Alien ainda reivindica algo do gênero. “É uma questão de não acreditar mais naquilo (Planet Hemp), mas na boa, somos amigos mesmo. Essa expansão econômica não acontece sem o crédito, dispositivo histórico de endividamento da classe trabalhadora. O capital entende então, que “quando essas pessoas passam a ter direito a consumir ela fica feliz”. Para se ter acesso a essa felicidade, é preciso manter-se na condição de consumidor, ou seja, aquele que contenta-se em comprar algo para satisfazer necessidades que o indivíduo deixou de produzir por si próprio. Ele consome não só o produto, mas todo um conjunto de valores, crenças e subjetividades.

A inevitabilidade do mercado, em sua última instância a serviço do sistema capitalista, é reiterada como forma única de vida, tornando a submissão forma natural de se viver. Tanto é assim que tem a famosa frase do acessor do Clinton: “idiota, é o mercado que resolve!” Não é? Bom, em geral é isso mesmo. Programa Roda Viva transmitido ao vivo no dia 05/12/2011)” Não só o rap ascende no mercado no período que aqui analisamos, mas o funk também. Num caso mais específico, o funk ostentação. No documentário “Funk Ostentação” temos a apresentação de um segmento do funk que dialoga diretamente com o consumo enquanto instrumento de poder, prestígio e inserção social a partir de 22 referenciais materiais supérfluos. No final do filme, uma fala nos chama atenção por sintetizar os mecanismos de justificativa do capital enquanto normatizador das relações: “Meu nome é Renato Meirelles, sou sócio-diretor do Data Popular (instituto de pesquisas especializado nas classes C, D e E) que estuda a nova classe média brasileira a onze anos.

Quando essas pessoas passam a ter direito a consumir ela fica feliz. Ela fica feliz porque ela sente que todo aquele esforço dela tá valendo a pena. Tá valendo a pena pra se vestir melhor, tá valendo a pena pra se apresentar pra sociedade de uma forma mais bacana e isso tem um impacto direto na sua autoestima e também tem um impacto direto no próprio mercado de trabalho. Afinal de contas, quem foi que disse que quem é da classe C e D só tem que tomar pinga, não pode tomar uísque? Quem acha isso é a elite, não é a classe C. A classe C consegue ter acesso a esses produtos, consegue ter acesso a esses serviços e começa a cantar isso nas suas músicas, começa a cantar isso no funk, começa a cantar isso em todas as suas manifestações culturais.

Guy Deborb, tese 63. Esse breve parênteses dialoga com os resultados contemporâneos não só do rap, mas do funk e de muitos outros segmentos musicais que aos poucos se aproximaram das configurações de mercado. Traz também uma forma de pensar o que estava sendo construído enquanto segmento independente já àquela época, década de 90 quando Black Alien e Speed interagem, afim de construir suas próprias identidades. O acesso a bens de consumo certamente foi fator crucial na construção dessa cena alternativa. Mesmo estes bens sendo ainda de difícil acesso, pois àquela altura assim como hoje não estávamos em par de igualdade com nossos vizinhos norte-americanos. A letra é rica em denúncias sobre o estigma social de uma juventude que busca outras entonações às coisas e ao mundo.

De Leve ironiza algumas das principais situações que muitos dos que ouviram o rap do largado já experimentaram em suas vidas. Dessa forma, estabeleceu-se o diálogo com um novo público, proporcionado pelo acesso a internet já ser mais facilitado ao final da década de 90 e início dos anos 2000 principalmente entre a classe média. Uma liberdade começava a ser conquistada. O mercado ao mesmo tempo em que aumenta a velocidade das mudanças tecnológicas também barateia o custo para quem deseja adquirir equipamentos que a indústria e o comércio consideram defasados. O estranho não é mais 25 bem vindo. A experimentação tampouco. As linguagens tornam-se rígidas e a tecnologia, por não contemplar à todos, torna-se uma aliada dos que tendem a fechar as possibilidades de novos grupos que desejam se inserir na cena.

Esse mecanismo não é algo pronto, finalizado. No processo de afirmação ele é sacralizado em confluência com o espetáculo. Já no início dos anos 90, Black Alien e Speed tiveram que sair de Niterói para se inserir em algo que já estivesse num ponto mais avançado. Àquela época, São Paulo já era a capital do rap. Mesmo que a proposta de música da dupla niteroiense não convergisse na maioria dos aspectos com o rap paulista, a troca entre as culturas era indispensável. São Paulo já havia desenvolvido um mercado. Já havia rappers de destaque como Sabotagem e Racionais MC´s a e nova escola crescia cada vez mais (podemos citar aí MC´s como Kamau, Parteum e outros). O rap independente esforça-se para não se confundir com o gênero rap comercialmente vinculado a grandes empresas.

Este novo segmento, por ter encontrado em seu trajeto histórico formas viáveis de triunfar e ascender de maneira desprendida ao comércio das grandes gravadoras e empresas multinacionais, visa manter-se como coisa distinta deste grande mercado, mesmo nas entrelinhas dialogando com ele. Mesmo que alguns estejam ligados à lógica de mercado capitalista ou queiram fazer parte dele, estes não o utilizam para os mesmos fins do rap mainstream. É importante destacar que o capital é necessário ao rap como um todo, mas é utilizado de formas diferenciadas e as cenas do rap tratadas no presente trabalho não se misturam mais ideologicamente, mesmo que as duas dependam muitas vezes da mesma fonte financiadora. Porém, mesmo tendo uma ascensão eminente, o rap independente aos poucos mergulhou em ideologias estéreis e pouco relevantes para dar continuidade às discussões e práticas de mudanças efetivas social e politicamente, que são parte da própria concepção e nascedouro do rap muito antes até dos limites que aqui analisamos.

De Leve - Eu e Marechal escrevíamos umas paradas na casa dele, mas tudo brincadeira, a gente nem gravava nada. Arthur Moura – Isso era em que ano mais ou menos? De Leve – Cara, eu posso arriscar que isso era em 1996. Tem tempo, cara. Tem tempo. Existe uma lacuna, tipo assim, hoje em dia você ouve rap, gosta de rap e rapidinho tu grava qualquer coisa. Nessa época o grupo já tinha um nível de divulgação razoável não só eixo Rio – São Paulo, mas começava a ganhar espaço em outros lugares do Brasil. Arthur Moura – Como vocês fizeram pra divulgar o som? De Leve – Então cara, a gente veio do nada, cara! Eu lembro até que eu que fazia essa parada. Eu ficava na internet, eu ficava no Napster com as músicas nossas assim, quatro músicas, a gente tinha quatro ou cinco músicas e eu fazia a busca: ‘Racionais’.

Quem tinha Racionais? Ah, usuário tal. Eu ia no cara e conversava com o cara. Isso não foi tipo, ah todo mundo se conheceu junto não. Isso foi uma coisa dele (Marechal). Ele saiu botando pra dentro e porra. e depois ele picou a mula, cara! E ficou todo mundo dentro de uma parada que ninguém se conhecia direito, cara. Foi uma parada que eu não tive escolha e também nem me oporia na época. Isso ocorreu antes de Black Alien entrar para o Planet Hemp. É importante também ressaltar que já nessa época rappers de diversas partes do Brasil pensavam em alternativas para o velho e batido rap gangster com todas as suas lamentações e atitudes rudes. Black Alien, Speed, Aori e DJ Babão dos Inumanos, Dom Negrone e os Três Pretos, De Leve, Shawlin, Mc Marechal, DJ Castro, Kamau, Mahal são apenas alguns exemplos de grupos, produtores e Mc´s que não estavam mais satisfeitos com o discurso do rap gangster e decidiram inovar.

Voltando ao Quinto Andar, é nessa época de formação artística, de discurso e estruturação de carreira que podemos observar com mais clareza os resultados que hoje analisamos. Que tipo de mercado estava se formando? É possível falar em mercado àquela época? O que ocorreu para haver um alargamento do discurso que antes era predominantemente direto, crítico incisivo à sociedade e às mazelas que compõem a trama social e que passou a formar o rap que hoje chamamos de alternativo? Mesmo àquela altura, sem lucrar financeiramente com a música (coisa que passou a acontecer somente algum tempo depois, e mesmo assim o resultado financeiro vinha muito mais dos poucos shows que faziam do que da venda de CD´s), seria uma negligência não enxergar a formação de um mercado alternativo onde coube à internet papel fundamental.

Não havendo recursos 32 financeiros, a única forma de se virar era por meio da improvisação. Mais uma vez podemos observar o aproveitamento de uma situação aparentemente ruim para algo que funcionasse. As posições em relação a isso são diversas. Vejamos. De Leve – A idéia era fazer. Eram temas tipo exaltação da mulher negra brasileira. Eu não, brother, eu faço zoação. Ao ser questionado se o Quinto Andar possuía algum tipo de ideologia no início, em outra entrevista que fiz no dia 18 de outubro de 2009 com o produtor de eventos e beat maker “M” (não quis ser identificado), este diz: “M” – A parada do Quinto Andar era ser largado, ser vagabundo, tu levar vantagem em cima das pessoas no trambique, tá ligado.

Essa era a ideologia do Quinto Andar. E todo mundo levava essa coisa como religião: você ser largado. São situações, sabe qual é? Não é uma ideologia. É uma parada que você tá sem grana, como é que você sobrevive, sabe qual é? Como é que a gente vive aqui em Niterói, como é que é as paradas. Essa música ficou tão conhecida que parece que é um hino da parada. Eu fico feliz pra caralho, porra! É uma música que eu fiz! Muita gente pergunta “o que você quis dizer?”, eu falo, meu irmão interpreta do seu jeito. Largado não é ideologia, tanto que eu só fiz uma música falando largado, eu não fico falando nas minhas músicas largado, largado. Sua carreira é marcada por uma série de singles, produção de eventos como a batalha do conhecimento e principalmente pela construção de aparatos ideológicos, seu ponto forte.

No início houve a “Dichinelo”, protótipo do que viria a ser mais tarde o conhecido “Um só Caminho”. De Leve gravou cinco discos e segue sua carreira fazendo parcerias com diversos artistas. DJ Castro toca com Black Alien. Kamau (SP) segue carreira solo e também faz parte d´“A Rua é Noiz”. UM SÓ CAMINHO E A RUA É NOIZ: ideologias de poder e consumo “É dócil um corpo que pode ser submetido, que pode ser utilizado, que pode ser transformado e aperfeiçoado. ” Michel Foucautl – Vigiar e Punir A construção de ideologias no hip hop mais especificamente no rap independente parte de um processo onde as práticas de poder são canalizadas para o domínio de uns sobre outros a partir de formulações políticas hierárquicas bem arquitetadas.

Quando um se torna predominante em seu segmento a pureza e o controle das produções tornam-se via de regra num cenário escasso onde, por práticas rígidas de sobrevivência, passa a não haver mais lugar para subversão contra a ordem estabelecida, mas sim um diálogo constante com suas instâncias prezando pela manutenção do estado de coisas. A partir disso, podemos nos debruçar sobre diversos exemplos. Todavia, pelo limite aqui imposto nos cabe analisar apenas um segmento e seus possíveis desdobramentos. Este pode concentra-se muito mais na ordem do poder-sobre em detrimento do poder-fazer, livre da ordem opressiva. O Mc conquistou acesso em muitas regiões do país sem grandes apoios, não restringindo-se apenas ao eixo Rio – São Paulo.

É importante ressaltar que toda a sua dinâmica política fora concebida nas ruas, em contato com diversos segmentos onde de fato pode construir sua carreira e seus ideais. Marechal é um dos poucos que ainda defende a ideia de que o hip hop é música de mensagem. Em seus shows, durante as performances, a alusão ao valor político da cultura é sempre lembrado. Numa palavra, a ideologia da competência institui a divisão social entre os competentes, que sabem e por isso mandam, e os incompetentes, que não sabem e por isso obedecem. ” (Marilena Chaui - Marilena Chauí rouba cena em debate: ‘classe média paulistana é sinistra’ Postado em: 4 set 2012 às 7:51) Para Filipe Ret a questão baseia-se por um moralismo. Arthur – Que tipo de moralismo você vê no rap? Ret – Você quer um exemplo real? Arthur – Aham.

Ret – Um só caminho, do Marechal, por exemplo. Um só caminho do Marechal acho que é um exemplo claro de pelo menos a ideia que tem pra passar ela ainda é um pouco moralista. O que, mano, de um lado é lamentável e por outro lado é legal porque, porra, deu certo. Eu acho que “Um só caminho” se foi meio que copiado, não sei, não sei se tem um só caminho lá, não sei se tem a mesma viagem do A Rua é Noiz lá fora. Mas se a gente copia, cara, a gente copia porque a gente meio quer interpretar uma viagem de fora pra acreditar mais na parada. O que, porra, não é legal. Infelizmente não é legal. Em a rua é noiz, no entanto, o teor protestante ganha importância fundamental em conceitos como “trabalho” trazendo neste conceito não mais a organicidade da união, da complementaridade e horizontalidade, mas da distinção daqueles que trabalham e dos que não trabalham, sendo estes categorizados como indignos, preguiçosos e incapazes, além, é claro, de atrapalhar o proceder dos que trabalham.

Para constatar tal afirmação, basta acompanhar postagens sobre o que vem a ser o valor do trabalho. Emicida foi um dos rappers que mais ganhou destaque. Recentemente apareceu na novela “Sangue Bom” e por receber algumas críticas expos sua visão sobre o fato. “E quem critica, fez o quê? Vai contar o quê? Construiu o quê? Porque eu vi e fiz o rap brasileiro chegar lá na Califórnia e dividir o festival com Nas, Damien Marley, Kanye West, Wiz Khalifa e outros monstros. Primeiramente quero lembrar que não escolhemos a profissão que temos por ser um caminho seguro, um caminho fácil ou convencional como a maioria das pessoas, nós escolhemos porque é o que somos e não conseguimos ir contra a nossa própria natureza, quando conseguimos, é porque nos julgamos da forma errada e corrigimos o curso.

Digo isso porque já tentei e me senti tranquilo, mas jamais realizado em outra profissão. Dito isso, quando você vir pessoas fazendo comentários do tipo "me amarro no seu som, tomara que não vire modinha", ou "fulano se vendeu" ligue o foda-se e seja fiel ao que você é, mas veja bem! quando uma pessoa deseja que você não vire modinha ela está dizendo na verdade o seguinte: 1- Tomara 2- Tomara 3- Tomara que que que seus você seja você sonhos nunca sempre nunca tão tenha se medíocre uma realizem! quanto casa eu! própria! 4- Tomara que você tenha que largar seus sonhos pra pagar suas contas como meu pai fez pra me sustentar. pois o pai de muitos é um modinha, um vendido e o fez por razões NOBRES!) 5- Tomara que você nade a vida toda contra a corrente! 6- Tomara que quando você não puder mais fazer o que ama, você morra de fome.

Tomara que quando você não puder mais fazer o que ama, você more na rua. Aquele que se opõe a tal modelo é categorizado como alguém que não trabalha e fala por falar, insiste em residir num mundo fracassado e por isso ameaça o fortalecimento das relações entre os que agora comandam o mercado. O mercado então é uma espécie de totem a quem devemos nos curvar e adorar, pois ele recompensa, mesmo que leve tempo e poucos possam gozar dos seus supostos benefícios. Sempre em tom arrogante e impositivo como se dissesse ali verdades inquestionáveis. Com isso, criam-se relações de poder e domínio que infringem a própria liberdade intelectual proposta de forma poética. É uma argumentação frágil e que depende de mecanismos bem arquitetados.

Por disputar o trabalho neste viés, entende que este deve ser feito por ele, o embaixador das ruas, o representante dos demais. Avancemos. No DVD “Realizando Sonhos”, Projota troca de roupa regularmente, assim como fazem os grandes cantores de rap e R&B americanos que utilizam dessa dinâmica para promover marcas e conceitos estilísticos de moda, estéticas e tendências de comportamento principalmente no âmbito juvenil. A transformação do rap em produto faz com que a mercadoria se universalize a partir do que o capital estabelece como normalidade ou formas de uso do que nos cerca. “É muito importante ter roupas novas”, diz Projota. Ele se apresenta como alguém aquecido pela postura filosófica de Marechal e este o trata com acolhimento enquanto Projota o revenera.

A “nova ordem” (projeto ideológico de Rashid, Projota e Emicida) possui uma rígida configuração de relações estabelecidas a partir da hierarquia entre aqueles que se entendem por iguais, verdadeiros, capazes, dignos e obviamente, que trabalham mais do que os demais. Assim é ativado toda uma relação entre homens honrados, dispostos a lutar como soldados frente àquilo que denominam a “nova ordem”. Esta ordem entende que para se ter sucesso é preciso foco, força e fé. Cabe ressaltar aí o imperativo protestante que estrutura o discurso de MC´s como Projota, Emicida e Rashid. ” (FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. Rio de Janeiro, Vozes, 1977. Pág. Com isso, criam-se relações de poder e domínio que infringem a própria liberdade intelectual proposta de forma poética. Por isso vemos a crítica do que vem de fora de sua órbita de controle como uma possibilidade distante e hostilizada nas palavras de Emicida.

A segurança garante a dignidade, assim 44 como o bem estar e uma suposta felicidade. Investe-se no outro um contingente de ações afirmativas que garante o mapeamento das condutas políticas e morais dentro do campo social. O espírito tutor não investe nas proposições e articulação entre saberes. Há o investimento no afeto mecânico das relações de troca e de gratidão para melhor funcionamento da subserviência. Entendemos que um só caminho configura-se próximo às instituições, que formatam limites de 45 comunicação negando a expansão, que por sua vez serve à funcionalidade de uma burocratização dos desejos. Delimita-se, então, as possibilidades de manifestação daquilo que estrutura o ser. Dias e horários para sentir um determinado sabor de comida, um comercial de TV que revela um desejo reprimido que pode ser alcançado pelo consumo, um jantar aos domingos com toda família onde se procura saber as notas dos filhos, suas conquistas ou sua situação financeira, uma aula na universidade que se pretende reveladora de certos conhecimentos, lugares para se divertir, morrer, fumar, fazer sexo, chorar, cheirar, orar, festejar, dormir.

Cabe a um tempo e espaço ou território pensado e delimitado à manifestação de algum sentimento, necessidade física ou até mesmo de experimentação possibilitar a manifestação das aparências, mas nunca da essência e contradições do ser. O indivíduo superinvestido de atenção e possibilidades oferecidas pelas mecânicas de domínio e burocratização dos desejos vê-se acuado perante suas frustrações, não encontrando lugar para o convívio com suas problemáticas que se anunciam como insolúveis perante o convívio opulento de oportunidades que a sociedade moderna ocidental possa oferecer. São Paulo, Expressão Popular, 2010. Pág. A sociedade de consumo utiliza termos como liberdade, prazer, individualidade, saúde, aptidão, identidade e escolha, apropriando-se e ressignificando-os a partir da necessidade da manutenção da lógica de consumo.

Nada além disso, ou seja, nada além da manutenção do status quo pode ganhar evidência, já que a solidez necessária para o cultivo de significados que elucidem questões com propriedades emancipatórias não fazem parte do repertório de suas propostas políticas. Exemplificando a questão, Bauman diz que “Num arroubo de sinceridade, um comercial de TV mostra uma multidão de mulheres com uma variedade de penteados e cores de cabelo enquanto o narrador comenta: ‘todas únicas; todas individuais: todas escolhem X’ (X sendo a marca anunciada de condicionador). Não dialogam com a luta de classes, mas afirmam um projeto burguês. Estão impossibilitados de refutar valores que deveriam ser refutados, pois estes mesmos são vistos como normais. Valores estes da sociedade de consumo liberal representativa.

Em outras palavras, o resultado da habilidade de construir uma ideologia híbrida em sua formação normativa insere valores mercadológicos e consumistas (além de tudo que surge daí) no seio da cultura hip hop, resultando em contradições que ao invés de estimular o rap para que este venha a combater a ordem, o rap, por sua vez, passa a ser um espelho que reflete a sociedade do espetáculo. A busca por inserir valores da sociedade de consumo na cultura hip hop aponta para caminhos muito mais complexos do que a aparente pureza que o rap discursa ter em sua lírica e posturas em geral. A CONSTRUÇÃO DE UM MERCADO ALTERNATIVO “É você usar os seus meios. O meio do “faça você mesmo”. Meio como os punks, brother.

Pra mim, underground vem daí. Meios alternativos de imprensa. A concepção de dom é fundamentada na predestinação do nascimento, um privilégio ou de algo inerente ao eu. Nascer com um dom direciona este eu pertencedor a uma carga de responsabilidade muito grande. Responsabilidade esta que ativa o constante posicionamento discursivo do sujeito privilegiado. Foge-se muitas vezes de reflexões sobre a construção do indivíduo e de tudo que o compõe como um permanente participante das trocas sociais. O indivíduo dotado de um dom ao se conciliar com os seus demais fundam um segmento diferenciado por uma concepção construída a partir da necessidade de disputa no seu campo social que mais tarde será cristalizado como um lugar de não-disputa pelo fato de se estabelecer ali não mais a emancipação política, mas relações de interesses diretos.

Para isso, é importante entender o panorama histórico das demandas musicais não só do rap, mas também de outros gêneros. A música apresenta-se também como forma de adquirir maior lucratividade não somente no setor financeiro, mas antes de tudo no acúmulo de capital simbólico e cultural. Neste caso é importante avaliar de que forma se insere determinada tendência musical no mercado analisando as relações de troca e dinâmica que se configura entre aquele que produz a música e aquele que a consome. A dinâmica tecnológica muitas vezes funciona como um simulacro para a reapropriação de antigos produtos passando a ressignificá-los para viabilizar a sua venda. A moda é um bom exemplo disso. Em shows é muito comum este tipo de assunto.

Nem todos estão habilitados a proferir seus posicionamentos e perspectivas políticas no rap. Primeiramente é necessário ganhar um espaço para habilitar a voz e sua propagação. Mas isso é um processo. Antes, há toda uma escola a se seguir para só assim se arriscar em linhas ampliadas por alto-falantes. Dessa forma, constrói-se a ideia de que alguns devem ser advogados, outros produtores, cinegrafistas ou motoristas. Alguns têm que se contentar com uma determinada função, mas o importante é aceitar e desenvolver cada vez mais esta capacidade para que o movimento cresça e ganhe mais propriedade e legitimidade dentro deste mercado que aos poucos o rap adentra, já que este mercado exige esta formatação. Esse é todo um desenrolar histórico e que ao longo de suas demandas e posturas vão concretizando uma ideia de hip hop ou de rap que vigora com muita força hoje.

Por algum tempo, acreditou-se estar realmente acontecendo mudanças significativas no rap. MC´s que antes só tinham prestígio dentro da cena hip hop ganharam projeção nacional. A ideia do rap combativo dentro da perspectiva da indústria fonográfica é sensual, tem uma postura séria e sóbria. Ele é político, estando muitas vezes inserido em programas sociais do governo ou tendo algum tipo de relação beneficiente imediatista com aquilo que propõe interferir. A pós-modernidade é um paradigma que transforma as contradições do passado em novas possibilidades, onde cabe ao indivíduo a criação, a liberdade e, é claro, o empreendedorismo. A modernidade e todas as suas formas rígidas de controle são reformuladas e estas formas de controle ganham novas validades com o poder do mercado capitalista apoiando suas perspectivas políticas.

São formas complementares que afirmam o projeto político democrático liberal burguês. O movimento dessa forma adere a ordenações contra a sua própria concepção política histórica de contestar o Estado, agente contraditório por essência e opressor por função. No começo, as rodas de rima eram manifestações livres formadas por jovens com o intuito de gerar uma nova configuração à cultura hip hop. A necessidade de popularizar essas manifestações urbanas levou alguns organizadores a aderir a uma série de posturas, dentre elas uma relação direta de tais manifestações com a ordem burguesa. A popularidade ou o intuito de se popularizar não gerou mais força política constestatória à ordem. Pelo contrário, o fato dessas rodas agora serem aceitas pelo Estado gera uma espécie de segurança tanto para os freqüentadores, que não serão mais incomodados pela polícia e moradores.

É muito comum um MC que afirma valores libertários, mas que em sua prática mantém as instâncias hierárquicas entre suas próprias relações artísticas. Estes constroem uma ideia de liberdade calcada na construção ideológica do controle, que visa à legitimação de suas verdades e posturas cínicas. A emancipação política do rap primeiramente deve permear o debate sobre arte engajada e o que vem a ser isso. A arte que se pretende engajada é incompatível com a arte espetaculosa e industrial, atrelada a construção de imagens que se encerram em si mesma. Uma relação de sustentabilidade também passa longe de reproduzir velhas práticas da indústria capitalista fonográfica. A transformação do discurso do rap para uma categoria profissionalizada exige que sua classe seja reconhecida e acima de tudo valorizada.

MC´s passam a não mais fazer shows de graça, começam a surgir premiações nas principais batalhas que tornam o espetáculo mais envolvente para os participantes acirrando também o nível de disputa que está em jogo. A profissionalização também surge como um discurso excludente. Os que detém mais tecnologia agregada são os que tem maior respeito e merecimento de estar na cena. São os que têm as músicas mais bem mixadas, os clipes em Full HD e seguidores que se pretendem fiéis. Arthur Moura - Por que era ruim? Shawlin - Porque eu era ruim, cara. Não adianta. Quem começa é ruim. Arthur Moura - É?! Shawlin - É, cara. Você não vai começar que nem os caras que são fodão não.

Nem Todos Serão MC´s. São Paulo, site Bocada Forte, publicado em 30 de Abril de 2010) No entanto, não basta apenas ter um dom ou ser “mais iluminado”, é preciso contentar-se com outras funções, que, a seu ver, não são menos dignas, porém, não gozam do mesmo prestígio e poder que um MC de sucesso, verdadeiro. Para Gilponês “é preciso reconhecer que nem todos no hip-hop serão MCs, DJs, B. boys ou grafiteiros. Nem todos os adeptos terão qualidade para passar pela peneira, cada vez mais rigorosa, de tais manifestações artísticas. Enquanto agir de forma amadora, o hip-hop nunca será levado a sério como sempre desejou. Alguns agentes do hip-hop já perceberam que nem todos serão MCs, DJs, b.

boys ou grafiteiros. Estão atentos à importância de trabalhar o verdadeiro sentido da palavra profissionalismo, sem que, para isso, tenham de vender suas almas, prostituir seus ideais ou jogar no time oposto - como fazem uns poucos pseudo-profissionais do jogo. Outros ainda se alimentam da ilusão de que o mundo só precisa de quatro - e não cinco - elementos para buscar melhorias. Agenciar o rap enquanto estrutura de poder, onde existem os cargos, funções e relações prontas como configura as disputas nos campos formais os qualificam a um novo estágio de ascensão. O acréscimo de valor e a expansão dos limites fazem parte da construção identitária que formam as componentes de legitimação discursiva do rap. Para isso, dentro da construção de um mercado há de se valorizar primeiramente a imagem daquele ou daquilo que é produzido.

O termo produção ganha aqui conotações vinculadas ao caráter moderno e tecnicista que com o advento da sociedade do espetáculo se imbricou numa metamorfose a serviço da razão instrumentalizada. O valor, neste caso, é agregado ao produto que é oferecido enquanto imagem espetaculosa. As possibilidades de criação ganham, portanto, o supervisionamento daquele que se pretende controlador do que é oferecido como arte. Esse é apenas um exemplo concreto dos reflexos de todo um modus operandi ou gerencial do que o mercado fonográfico oferece às novas culturas que desejam se inserir no mercado. Dessa forma, muitos segmentos do rap inseriram-se num contexto novo, mais amplo, mais visível. No caso do single “Chefe de Quadrilha”, os autores, mesmo propondo refutar supostos benefícios adquiridos por meios corrompidos, não abrem mão do conforto proporcionado por posses materiais e um ethos próximos dos corrompidos pelo luxo e o prazer banal oferecido pela opulência.

Constrói-se a ideia de merecimento para que isso seja legítimo e possível, tendo este merecimento uma espécie de recompensa material pelo sucesso conquistado. Marcelo D2, Mr. Catra, André Ramiro, são apenas alguns exemplos de associação direta. O mercado é potencializado. De um lado, um mercado próspero vindo de um segmento novo. Do outro, um mercado muito maior, sedento por essa fatia que se anuncia. Novas descobertas tecnológicas proporcionaram não só uma nova logística, mas novas sonoridades, texturas, linguagens e técnicas. Para Benjamin, a reprodução da arte impossibilita a existência do seu principal valor: a autenticidade. O autor afirma que com a ausência da autenticidade o que fica abalado “é a autoridade da coisa”, proporcionando assim só mais um fenômeno de massas.

A arte enquanto expressão permanente e dialética do possível, força propulsora de mudanças, engajada e expressiva não deve abdicar da sua reprodução. A arte não se encerra por si só. E o ser neste caso não define toda a plenitude possível da existência. O contato e formas para que aspire à plenitude, deverá ultrapassar a experiência de sensações geradas por apenas um pôr-do-sol. Essa discussão propõe o contato e a conexão com o que antes era desconhecido. A autenticidade, no caso do rap, é a resultante dialética entre os dois campos de transformação em disputa: a arte e a continuidade da sua função pelo segmento social que não encerra-se enquanto meramente um receptor.

A discussão dessa temática no rap fora abandonada por se acreditar que a ascensão da ideia de rap independente, mantenedora em suas práticas de elementos distanciadores de relações horizontais é a melhor opção para levar adiante o rap como manifestação popular. A consonância entre a cultura de resistência e o mercado são impraticáveis por diferirem e divergirem em sua essência ou mesmo no projeto político que defendem. O apoio mútuo não depende de estruturas comuns do mercado, como a rigidez ideológica, o controle sobre o outro, relações hierárquicas, carreirismo, competição e relação utilitária com o público. Muitos grupos de rap independente que hoje pertencem ao mercado construíram uma ideia de sucesso e possibilidade oficial de se sustentar com a arte por meio de uma espécie de mercado alternativo.

Este mercado, diferente do apoio mútuo, transforma parcerias em relações de negócios, comunicação em marketing e sucesso em mercado. Fomenta as disputas e não ao aprimoramento da arte, os limites e não as possibilidades, o enclausuramento e não novas formas de modalização das subjetividades. Dentro dessa configuração uma minoria sai ganhando, pois ela se aproveita perfeitamente bem dessas contradições, não estendendo sua mão para os resultados de tais atos. Essa comunicação produz valores e conhecimentos deturpados sobre as causas reais da tão chamada crise, que não sai da boca de doutores, donas de casa, jornalistas, artistas. Os cidadãos são convidados a votar e assim giram a máquina. Essa máquina quando se movimenta gera efeitos contrários para o lado que a observa.

Assim, os comunicadores produzem muitas vezes informações caóticas, desconexas, mesmo quando muito com boas intenções. O esvaziamento da esfera pública é resultado da transformação desses espaços em coisa privada. A transformação do público em privado resulta também na via expressa que os indivíduos se constroem. São indivíduos que carecem de inserção do seu eu na coisa pública para privilegiar as suas questões de satisfação interna como anúncio principal do seu ser. Agora, apoderado de sua individualidade conquistada às custas da razão instrumentalizada, o indivíduo canta alto a sua conquista da liberdade vigiada e controlada. Para agir em conjunto, este indivíduo precisa ter certeza de seus objetivos imediatos que seu empreendimento proporcionará. Alimenta a possibilidade do movimento se burocratizar e transforma o conceito de conquista em acordos diplomáticos.

Uma conotação distinta das lutas revolucionárias. Uma democracia pautada pela burocracia eleitoreira não conseguirá na prática negar as principais contradições do liberalismo e de todas as formas de controle social inventadas pela modernidade. A perspectiva de igualdade perante a lei enquadra o gênero humano dentro do contratualismo. Há de se pensar, portanto, qual diretriz política historicamente se aproveitou dessa forma de organização social para manter as bases de exploração e controle de uma classe em detrimento de outra. Este projeto prioriza as demandas dos que detém o poder e o poder não está a serviço do povo. Ter direitos dentro da concepção burguesa não garante a igualdade, mas sim a permanência dos aparatos que garantem a supremacia do estado e do capital.

Dessa forma é impossível que os indivíduos possam desenvolver suas autonomias, já que estarão sujeitos a demandas que não prioriza a liberdade, mas sim o controle sob a forma de organização institucional. Eleger significa não só exercer o poder, mas manifestar a 66 origem do poder, repondo o princípio afirmado pelos romanos quando inventaram a política: eleger é dar a alguém aquilo que se possui, porque ninguém pode dar o que não tem. Eleger é afirmar-se soberano para escolher ocupantes temporários do governo. As críticas do post apontam para uma insatisfação com o estabelecimento da aliança firmada entre representantes do hip hop e atual gestão da prefeitura. A disputa política democrática-representativa entre as instâncias de poder não resume a problemática em si.

Apontam somente para as questões internas da disputa pelo poder passando longe da quebra de paradigmas. Não são apenas os representantes do movimento hip hop que firmaram acordo com a prefeitura os únicos a disputar uma posição de poder, mas principalmente os aparelhos e estruturas históricas, como partidos e sindicatos. A luta do hip hop historicamente deixou de ser a revolução social para resumir-se a disputa pelo poder. Prefeitos, governadores, presidentes vem e vão, e as conquistas ficam. ” (DJ Sadam, post do Facebook, 2012) A esquerda que Sadam defende é a oposição enquanto imagem, partidária e burocrática. Essa oposição não abre mão de manter acordos com a direita por fazer parte do mesmo aparelho burocrático, que historicamente ignorou as contradições sociais para manter o status quo da classe burguesa funcionando como mantenedor das bases de exploração.

As relações burocráticas abrem a necessidade então de se construir o que Sadam denomina como “relações institucionais”. Devemos questionar nesse caso o porquê da necessidade de se construir tais relações em detrimento das relações autogestionárias, populares, horizontais e participativas, onde não cabe espaço para a institucionalização dos corpos e das suas funções normativas. Onde o ingresso é muito caro e nosso povo não é contemplado. Para dizer que o movimento Funk está representado nesta reunião, tinha que está muita gente ai. ” (Repper Fiell – Coletivo de hip-hop - Visão da Favela, post do Facebook, 2012) O uso da mídia neste caso funciona como forma de propagandear um acordo político e escamotear ao máximo as contradições, não sustentando um debate que leve adiante mudanças concretas nas formas de organização do movimento hip hop.

Àqueles que organizam as rodas e representam o movimento, a sensação de dever cumprido. E, é claro, a crítica aí também não é bem vinda. Para dialogar melhor com o que desejamos abordar, trazemos como exemplo concreto a construção do discurso pós-moderno no rap independente através do MC carioca Filipe Ret, que antes compunha o grupo Numa Margem Distante que faz parte mais especificamente da Zona Sul do Rio de Janeiro. O bairrismo e o fortalecimento de uma cena local se insere como forma de ascensão de determinados grupos portadores de uma busca política especificamente criada para assegurar o sucesso e a inserção de um mercado. Por isso o bairro do Catete torna-se palco não somente dos relatos líricos de Ret, mas seu território e este deve ser defendido constantemente.

As multiplicidades, no entanto, passam a confinar-se dentro da perspectiva do coleguismo e da tolerância irreflexiva. A construção do mercado no rap independente só foi possível graças ao seu próprio empenho em construir uma estrutura “sustentável” que ao mesmo tempo em que procura tornar explícito a sua posição contrária às amarras de produção que a indústria cultural já tinha estabelecido com diversos outros estilos musicais, também não deixa de lado velhas formas que garantisse a sua posição enquanto estrutura de poder. Aqui entendemos o desejo tal qual Deleuze nos afirma, ou seja, como um conjunto de situações e não somente algo em específico. Um formador de opinião é aquele que está apto a se posicionar para em última instância modificar as formas de pensamento vigente.

São cientes de sua posição de prestígio e têm a vantagem de usar isso como forma de potencializar seu poder de comunicação, influência e persuasão. Dessa forma, ganham espaço em mídias que antes poderiam oferecer algum perigo à sua carreira. A possibilidade de congregar interesses a seu ver revolucionários com o poder da mídia burguesa torna-se viável, possível e estimulada àqueles que trabalham em prol de objetivos centrados nos negócios que proporcionam uma posição de privilégio de suas carreiras. Ao colocar essa questão, Eagleton nos provoca a pensar melhor sobre as formas de domínio e poder que persistem com força total na contemporaneidade. Para pensar a transformação nas formas de punição sobre o corpo e a alma, Foucault analisa a jurisdição e as formas de aplicar a punição àqueles dignos de cura.

Essa transformação, para Foucault, é bem evidente entre os séculos XVIII e XIX, quando o modelo de punição passa por um longo processo até a modernidade. Sendo assim, o papel de quem pune, daquele que cabe o julgamento é também modificado sob forma a acompanhar aquilo que se entendia por humanismo. Os castigos impressos no corpo de forma a tornar a dor evidente são, a partir de meados do século XIX, substituído pela reclusão e privação da liberdade, onde cabe não mais ao corpo o pagamento do suplício, mas à alma que não mais goza de liberdade. Em uma de suas frases de efeito Ret afirma que “subestimamos o presente. Superestimamos o passado”, trazendo a noção de que o passado não deve ser tão investido de sentido frente às premências do presente hiper-fluidifico.

Sendo assim, nossas impressões do agora devem permanecer como fator de sentido daquele que se pretende livre numa sociedade opressora. As impressões, por sua vez, não só se difere de uma construção identitária sólida como é também contra a sua possibilidade, já que não abre canais de investigação crítica, tampouco uma relação saudável com o próprio tempo em que se experimenta em vida. Essa forma aparente de se opor às estruturas sociais investidas de poder revestem-se sob a imagem da transgressão e revolta afirmando valores que sustentam a sociedade de consumo e a escravidão voluntária. As impressões à pele nesse caso servem como contato seguro que já é substituído por uma nova forma numa velocidade impressionante.

Frente a essa relação de experimentação fluidífica, homens e mulheres estariam a salvos perante as incertezas que a própria História trouxe para aqueles que lutaram por transformações em longo prazo e sofreram os tormentos reais de uma revolução social. No tempo do agora, do agorinha, não cabe transformar o mundo em sua totalidade, pois isso é impossível dentro da finitude que nos encontramos enquanto espécie viva. Essa finitude, no entanto, justifica e não cessa de servir de máxima às premências do presente. Dentro dessa perspectiva, basta viver da melhor forma, ter acesso aos segmentos mais importantes, ser um formador de opinião, levar a vida longe de problemas sociais, pois os problemas desse tempo não nos diz respeito, não diz respeito àquele que se pretende gênero livre.

Dentro disso tudo, Ret constrói a ideia de rap libertário, que acompanha bem uma passagem de Terry Eagleton no qual este diz: “Ao mesmo tempo libertário e determinista, sonha com um sujeito humano livre de limitações, deslizando feito um desvairado de uma posição a outra, e sustenta simultaneamente que o sujeito é o mero efeito do conjunto de forças que o constituem. Acredita em estilo e em prazer, e costuma produzir de modo mecânico e em abundância textos que os próprios computadores, em vez de só servirem de instrumento, deveriam gerar. Pois a teoria pós-modernista desconfia de histórias lineares, sobretudo daquelas em que ela aparece como nada mais que um episódio. ” (EAGLETON, Terry. As Ilusões do Pós-Modernismo. Trata-se de uma heterodoxia de todo ortodoxa, que como qualquer forma imaginária de identidade precisa de seus bichos-papões e alvos imaginários para manter-se na ativa.

A cultura pós-modernista produziu, em sua breve existência, um conjunto de obras ricas, ousadas e divertidas em todos os campos da arte, que de forma alguma podem ser imputadas a uma rejeição política. Ela também gerou um excesso de material kitsch execrável. Derrubou bom número de certezas complacentes, escancarou totalidades paranoicas, contaminou purezas protegidas com desvelo, distorceu normas opressoras e abalou bases de aparência frágil. Como consequência, desorientou de modo adequado aqueles que sabiam perfeitamente quem eram, e desarmou os que precisavam saber quem eram diante daqueles que queria demais dizer a eles quem eram. Os dois trabalham lado a lado, pois o silêncio serve como primeiro passo a um apagamento de questões que deveriam manter-se vivas na memória e na ordem do dia.

O esquecimento, assim como o silêncio, também serve a um objetivo. Todavia, encontra um obstáculo maior: a relação com o tempo. O silêncio, por sua vez, não só abre caminhos para tal, mas persuade no agora e impõe o comportamento resignado, nem por isso inofensivo. Pelo contrário, a sua aparente sutileza institui no agora a opções pela ofensiva camuflada. Trata-se de formas desproporcionais de composição da própria vida. O silêncio usa da covardia, mas tampouco concorda que este seja seu baluarte, pois seu discurso está oculto, mesmo que seja construído para ocupar a ordem do absoluto. Contradição? Não. Apenas parte do mecanismo de imposição, seja ela qual for, que o silenciamento estabelece no social. A mecânica discursiva do esquecimento depende da disposição em silenciar contradições que alimentam as disparidades sociais.

” Nesse caso, as oposições inexistem no projeto defendido pelo silenciamento das contradições que movem o agora. Em outras palavras, existe a ignorância. Dessa forma, ocorre não só o enquadramento da memória, mas das condutas humanas, instalando então um regime de violência às adversidades. Para Pollak, “ainda que quase sempre acreditem que “o tempo trabalha a seu favor” e que o “esquecimento e o perdão se instalam com o tempo”, os dominantes frequentemente são levados a reconhecer, demasiado tarde e com pesar, que o intervalo pode contribuir para reforçar a amargura, o ressentimento e o ódio dos dominados, que se exprimem então com os gritos da contraviolência”. Dessa forma entendemos a quem serve a ignorância. Não tem nada estouradão.

Arthur – Como que esse rap se insere no mercado? De que forma eles estão criando a coisa? Ret – Como que essa indústria pode crescer? Arthur – Como que eles estão se inserindo no mercado? Como que tá se formatando esse mercado? Ret – Cara, a internet é um meio fundamental, com certeza aí democrático pra caralho. Pode soltar suas músicas, divulgar, fazer a galerinha ouvir. Eu conheço muita gente que ouve só as paradas que os amigos fazem. Eu acho isso genial. Também tem um pouco disso, né? Ret – É. Na medida que esse canal é uma máquina, mané, tu se isola. Mas acho que vem pro bem. Eu acho que o lance é publicar-se. Acreditar no que fala e se publicar, saber cada vez mais aparecer pra cada vez mais gente se preparar pra se mostrar pra cada vez mais gente.

Por isso que eu tô falando que essa hierarquia acho que é do ponto de vista industrial. Porque se tu vai fazer a parada, tu vai colocar os malucos que rendem mais já, né? Mas porque eles rendem mais já? Por vários motivos. Os caras têm qualidade a mais tempo do que os que estão surgindo agora. Ou no mínimo se dedicaram mais tempo, né? Algumas coisas atropelam outras, sabe qual é? Às vezes um tá ali se divertindo pode sim ter mais qualidade do que um que tá há muito tempo, mas que está na escala superior só porque está há mais tempo. Pode ser. Isso é um poder. A palavra, né? Quando é emitida e faz vibrar alguma coisa em alguém. É porque é foda. Poder aí envolve liberdade e outras várias paradas.

Uma coisa é você falar certa coisa pra cinco pessoas que não têm muito esclarecimento. Arthur – Não ser ousado? Ret – Eu acho que a primeira coisa que ele faz é não ser ousado. Acho que é do ser humano ele não ousar tanto quando tá entrando. Ele sempre entra na humildade. Mas às vezes essa humildade ele não enxerga que tá entrando na humildade. Então às vezes ele acha que aquilo ali é meio que o certo mesmo. E por isso eu acho sim, por isso eu acho importante nego olhar os outros com olhar crítico sim, sabe qual é. Não necessariamente denegrir, mas se ouvir, ter um olhar crítico ali, tal. E às vezes não ouvir muito, sabe qual é. Acho que também se envolve muito se ouvir muito.

Também e preciso se des-envolver. O próprio nome que tu coloca na parada tu já tá meio que definindo, sacoé. Numa Margem Distante acho que a ideia é basicamente essa. Tipo, estar numa margem, que não é essa marginalidade aí. É uma outra marginalidade. Tipo, marginalize-se dessa marginalidade. As diferenças só enriquecem mesmo. Leonardo – Como você enxerga o rap, você inserido nele também, né, cara? Ret – Cara, eu queria que o rap fosse um pouco mais rock´n´roll. Queria mesmo, assim. Queria muito que o rap tivesse sim esse lado do gueto sim, mas que tivesse o lado mais anárquico. É preciso. Essa letra tá escrita. É uma letra gay. E aí, sabe qual é? Bota pra rolo? Será que é só em primeira pessoa que a gente pode cantar? Tem que sair dessa.

Tem que se colocar nos outros lugares mesmo. Pra fazer isso demora muito. Para discutir os efeitos do prazer enquanto possibilidade distante do gozo pleno ou até mesmo da experiência continuada das multiplicidades dos sentidos hoje, não poderíamos deixar de fazer menção às transformações de toda uma conjuntura do sistema capitalista tal como se configura em 2013. Assim também como não poderíamos deixar de fazer menção à pós-modernidade e aos seus efeitos fluidos em tempos rígidos. Seria relevante ainda esclarecermos o que se entende por massa e luta de classes. O fato é que tudo isso nos dá um entendimento global, holístico e mais consistente ao que pretendemos analisar, neste caso, o rap. O prazer, assim como qualquer outra mercadoria no sistema capitalista, é oferecido em abundância em nossa sociedade.

A negação e rejeição do prazer no próprio prazer é o que mantém e garante o bom ordenamento e a manutenção da dependência ao vazio, a só o que lhe é oferecido. O que é oferecido, todavia, não gera nenhuma dúvida sobre seus valores por se apresentar enquanto possibilidade de escolha. O personalizado (também real na sociedade de consumo), aquilo que é construído para um certo alguém, para aquele que possui uma determinada distinção social, que muitas vezes é o que garante a sua manutenção no meio, já não é mais nenhuma novidade no sistema capitalista. Sendo assim, esvai-se toda a possibilidade de dúvida sobre aquilo que se manifesta enquanto mercadoria. A mercadoria não é mal vista na sociedade que atua a favor de distinções sociais ou que busca estabelecer domínio sobre qualquer outro segmento da sociedade.

Não seria irônico constatar que a gratidão e submissão daquele que é subjugado às formas de controle e domínio não se distinguem na sociedade moderna. Elas são sinônimos na sociedade de controle. São duas faces da mesma moeda. São aparatos discursivos que se infiltram nos valores e constructos sociais e a sua permanência não pode escamotear para sempre o conflito que se anuncia. É só observarmos, por exemplo, os rumos que o capital toma legitimado, obviamente, pelo estado. Sua música é banalizada frente a potência que oferece. Potência que para a burguesia é algo a ser neutralizado, pois do contrário é arriscado acontecer algum problema maior. Por isso há um grande investimento em tornar essa coisa que se denomina massa num enorme mercado onde a banalidade é moeda corrente.

A banalidade esvazia para inutilizar tudo aquilo que possa causar constrangimento à ordem estabelecida. Banalizar uma ida ao cinema transforma o ritual em distinção social. Historicamente sabemos que tais regimes dependem da manutenção da obediência e do bom convívio normatizados por regras e leis. Se formos analisar o caso do Brasil, perceberemos uma forte disposição à manutenção de grupos que não abrem mão do bom funcionamento da máquina estatal acompanhada da economia capitalista. O neoliberalismo, sustentado por um estado que procura em suas ações trilhar o que se almeja por estado democrático de direitos, fortificado por condutas populistas e práticas fascistas (que historicamente também funcionou muito no controle das massas) age 88 como principal aparato que legitima uma esquerda burocrática e partidária e que há muito se aliou às disputas pelo poder fora das ruas.

Adorno sugere uma análise frente a ascensão do nazismo em confluência com a forte propulsão do capital. O estado de hoje sugere uma aproximação com o que é diferente com o intuito de docilizar a sua manifestação. O rap independente, por exemplo, por já ocupar lugares de prestígio inclusive entre aqueles outros que também fazem parte do rap, sentem-se indispostos a discutir até mesmo pequenas contradições por priorizar uma série de coisas e afazeres que secundarizam problematizar a fundo o que vem sendo construído. O rap independente aqui analisado construiu canais e redes de comunicação que consomem ideais prontos e valores supérfluos e que legitimam a necessidade de uma relação igualmente fantasiosa. Essas redes e canais de comunicação é algo, portanto, muito cobiçado entre artistas do rap independente.

Essa rede não suporta algo que vai além do gerenciamento de carreiras, construção de mitos e uma falsa apreensão da dimensão dos conflitos sociais. Essa rede tende a crescer na medida em que consegue se popularizar um artista. Com isso, ambas as partes se beneficiam. Para isso, temos inúmeros exemplos de fora e de dentro do Brasil. Quando a intriga não existe, ela é forjada, pois se estabeleceu que a combatividade do MC é mensurada pela sua afirmação enquanto superior e verdadeiro. Vide as famosas tretas entre Marechal e Cabal, Gutierrez e P Rima, De Leve e Marcelo D2, Nocivo Shomon e Emicida, entre muitos outros. Tudo isso se sustenta pelo caráter espetaculoso. Para Adorno, 90 “o prazer só tem lugar ainda onde há presença imediata, tangível, corporal.

Onde carece de aparecia estética e ele mesmo fictício e aparente segundo critérios estéticos e engana ao mesmo tempo o consumidor acerca da sua natureza. Somente se mantém fidelidade à possibilidade do prazer onde cessa a mera aparência”. Pudemos constatar ao longo do presente trabalho que a construção da autonomia no rap independente é forjada segundo critérios de reprodução passiva de mecanismos já experimentados exaustivamente por aparatos burocráticos coercitivos ao longo da história. Se estudarmos o teor lírico de MC´s em destaque de hoje encontraremos poucas semelhanças com aquilo que inicialmente moveu o surgimento do hip hop como manifestação de negação às opressões garantidas pela sociedade dividida em classes. Aliás, é no olimpo acadêmico onde esse mito da objetividade é construído.

“A modificação da função atinge todos os tipos de música”, diz Adorno. E a essa modificação nos compenetraremos para entender de forma não superficial as contradições que o rap manifesta, buscando assim ao mesmo 91 tempo em que desconstruímos verdades impossibilitamos que mais mentiras sejam concretizadas. A música ligeira que Adorno se refere também se modificou historicamente. Ela deixou de ser algo só de um setor da sociedade abarcando todas as possibilidades da arte. A ideia de uma reforma agrária da música brasileira, que segundo Emicida vem sendo promovida por ele próprio, é muito bem aceita pelo público. Os latifundiários seriam as grandes gravadoras que estariam sendo superadas pelas novas formas de organização de artistas independentes. Mas ser independente e manter uma imagem estável requer ao MC ou ao grupo arriscar adentrar em setores que teoricamente são criticados por esses mesmos MC´s e grupos de forma dissimulada e cínica.

E esses canais, obviamente, não comportam a crítica direta contra as suas estruturas de mercado e argumentos nefastos. Por isso, não é problema algum para um MC que deseja adentrar 92 nesse esquema ter a sua imagem atrelada a uma grande empresa ou emissora de TV como MTV ou rede Globo. É importante também estabelecer parcerias para consolidar as redes de interesses. Essas parcerias em nada dialogam com o apoio mútuo. A configuração do mercado nega o apoio mútuo, pois este não depende do prestígio e das distinções sociais. Em outro programa, o entrevistador pergunta como foi trabalhar com a banda Nx Zero. Emicida - “cara, foi legal pra caramba. Emicida foi um dos rappers que mais ganhou destaque no Brasil. Junto 93 dele antes tinha MC Marechal no Rio (D2 já alcançara prestígio bem antes) e em São Paulo mais tarde se revelaria Criolo Doido.

Há uma infinidade de outros grupos, alguns já com muito prestígio, como Cone Crew Diretoria, outros ainda angariando espaço em meio a rebarba dessa onda, como Cartel MC´s, Kamau, Flora Matos, Pentágono, Filipe Ret e muitos outros. Os programas direcionados à juventude sempre contam com um apresentador bem humorado, descontraído e fútil. Os apresentadores se apropriam de uma postura mais alternativa e dos códigos de linguagem do rap afim de estabelecer uma falsa aproximação com o rapper. “Deus me fez maior e os que são menos que isso vão ter que falar de mim. Ele me fez maior. ” A pedância e a arrogância ganha um ar nobre. Para Adorno, “a ilusória convicção da superioridade da música ligeira em relação à séria tem como fundamento precisamente essa passividade das massas, que colocam o consumo da música ligeira em oposição às necessidades objetivas daqueles que a consomem”.

Em mais um programa, o apresentador Antônio Abujampa pergunta: “Leandro Roque de Oliveira, você é de direita moderna ou de esquerda moderna?” Emicida - “Eu sou o povo, cara. Como este período foi marcado por intensas revoluções e avanços significativos na possibilidade de transformação dessa comunicação, a cultura encontrou aparatos técnicos que projetou o que se entende por massa em escala global. Dentro do contexto político da luta de classes entre os detentores dos meios materiais e aqueles que não possuem tais meios, estabeleceu-se uma separação entre interesses culturais e uma convenção de massa subordinada às técnicas de reprodução da arte subjugada ao domínio burguês. A nova etapa da consciência musical das massas que Adorno se refere é justamente marcada pela intensa luta entre os interesses de classes a partir do surgimento do período moderno.

A partir da hegemonia padronizada viabilizada pela detenção de meios industriais da produção da cultura pela classe dominante, entende-se a cultura de massa como apenas um depósito de mercadorias sem valor de transformação social. O comércio e as leis do mercado são muito mais tangíveis do que uma maior investida na qualidade cultural. A massificação de informações na internet e no facebook atende a uma técnica do auto-respaldo do artista, inseguro sobre seus próprios pensamentos e posições políticas. Para sanar aquilo que ele próprio não pode oferecer, alia-se às repetições contínuas do mesmo. Segundo Adorno, “o processo de coisificação atinge a sua própria estrutura interna. Tais obras transformam-se em um conglomerado de ideias, de “achados”, que são inculcados aos ouvintes através de amplificações e repetições contínuas, sem que a organização do conjunto possa exercer a mínima influência contrária”.

O rap independente aprendeu a forjar os seus próprios ídolos e os ídolos construídos formam outros ídolos e assim sucessivamente a produtividade continua em escala global. Acreditar que técnicas trarão por si só os resultados esperados é continuar acreditando no bom uso domesticado dessas ferramentas para a manutenção do status quo. O processo de disputa que se configura a partir dessa tensão elimina as dúvidas sobre os interesses inconciliáveis entre as diferentes classes em disputa. A ressignificação dos valores não se dá apenas na batalha do campo das ideias, mas também no uso prático que é feito das técnicas e ferramentas necessárias à produção da arte. A arte engajada rejeita a reprodução da lógica burguesa, produtivista, mesquinha, retrógada e coisificada.

A massificação de valores defende um projeto de classes pela própria intenção da comunicação de massa: propagar em grande escala um determinado ideal. Dentro dessa reflexão também cabe pensar os caminhos possíveis à construção do apoio mútuo no rap, longe das relações de prestígio construídas por MC´s-empresários. CONCLUSÃO Para Lívia de Tomasi, “as vicissitudes políticas do movimento Hip Hop no Brasil, as tentativas de organização em escala nacional, a infiltração de partidos políticos, a cooptação por parte do poder público, a fortuna de alguns artistas e o anonimato de muitos grupos, a “profissionalização” perseguida por alguns e a “autonomia” reivindicada por outros, mereceriam um estudo especifico. ” Investigando muitos desses pontos chegamos a conclusões importantes para a atual configuração do rap independente.

Existindo como um discurso cético a cerca das multiplicidades o rap independente (ou underground) camufla-se com tinturas libertárias principalmente por vender uma ideia de produzir um contestamento social contundente e incisivo na sociedade. No entanto, a denúncia contra o opressor ganha um teor espetaculoso pelo fato de reproduzirem o discurso daqueles que os oprimem. As vielas e becos, duras da polícia, discriminação racial e todo um complexo do social da classe pauperizada alinhada a uma crítica de transformação ganhou novas conotações quando do surgimento da possibilidade de ascensão do rap independente/underground a partir do início dos anos 2000. A autonomia do rap perdeuse dentro do seu próprio discurso de independência quando não mais pode sustentar as utopias e transformações sociais, projeto político não só da classe trabalhadora, mas do próprio ser em emancipação.

Esse fato, por sua vez, aponta para uma evidência que fica clara nas abordagens dos MC´s em suas letras, onde a ideia de contestação é canalizada em acertos de contas contra “faladores” que passam mal transformando o inimigo em qualquer movimento que ameace a carreira do artista. A categoria “independência” dentro da construção discursiva do rap traz em sua forma as propriedades estéticas das lutas sociais acreditando assim atingir alto grau de conscientização dos ouvintes. As discriminações e demais contradições sociais que serviram de base à construção do discurso do rap são agora secundarizadas na sua expressão artística em detrimento de categorias individuais, não atendo-se, portanto, a um projeto transformador dentro de uma perspectiva democrática, autogestionada. Situações do espírito, lugares bonitos, pratos do dia, frases de efeito, uma nova roupa ou tênis, uma declaração de fã, o novo clipe do snoop dog ou a nova música do D2 misturando samba e rap, comentários políticos breves e superficiais, apoio a candidatos, pequenas crises existenciais, máximas das mais variadas, pseudo-revoltas, auto-afirmações e polêmicas virtuais, tudo isso são pequenos exemplos de manifestações de MC´s, grupos de rap, grafiteiros, produtores e DJ´s que diariamente constroem as suas carreiras a partir de uma relação doentia com a comunicação instantânea.

A rápida resposta dos fãs a essas manifestações possibilita um eficiente mapeamento de temas que mais repercutem possibilitando assim maior controle estatístico orientado por sua vez às disputas entre mercados. Além de transformar, é claro, os MC´s em formadores de opinião pública legitimados por uma ideologia da competência. Esse movimento acompanha a comunicação enquanto exercício de poder. A construção de uma identidade dentro de um espaço em disputa é o maior desafio que uma linguagem ou conceito artístico tem para experimentar numa realidade concreta transformações que possibilitem novas codificações subjetivas. É certo que a afirmação no rap existe desde a sua construção discursiva. Dessa forma, entendemos que a afirmação do MC encontra-se dentro do ethos cultural, ou seja, é algo que pertence a priori aos dispositivos políticos do rap.

O discurso assim configurado não encerra-se em sua própria forma, ou seja, ele não é um fim em si mesmo. O discurso é o condutor de um acúmulo social que visa transformar o todo funcionando então como agente alinhado à singularidade do ser. A afirmação então não é ferramenta que serve ao carreirismo. FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. Rio de Janeiro, Vozes, 1977. JANE SPINK, Mary; SPINK, Peter. Práticas Cotidianas e a Naturalização da Desigualdade. Occupy, movimentos de protesto que tomaram as ruas. São Paulo, Boitempo, 2012. HALLET CARR, Edward. Que é História? São Paulo, Paz e Terra, 1961. GIDDENS, Anthony. São Paulo, Expressão Popular, 2008. HALL, Stuart. A Identidade Cultural na Pós-modernidade. Rio de Janeiro, DP&A, 2006. NELSON COUTINHO, Carlos. Rio de Janeiro, UFRJ, 2006.

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Direção: Tarja Preta. Rio de Janeiro, 2006. Brega S. A.

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